Aline Silva coleciona medalhas e dispensa apresentações. A maior atleta do wrestling brasileiro, no entanto, quer mais e já pode adicionar outra conquista ao seu currículo. Na última segunda-feira (7), após uma conturbada eleição para presidência da CBW (Confederação Brasileira de Wrestling), Flávio Cabral foi eleito para o cargo. E com dois postos de vice-presidente, um deles será justamente de Aline, que busca deixar um legado para além das lutas.
“Confesso que a princípio fiquei um pouco relutante por ainda estar atuando como atleta. Eu não queria entrar em algo que eu não pudesse me dedicar. Já estou com 34 anos, caminhando para a aposentadoria e começa aquela reflexão: eu consegui contribuir muito para o meu esporte com medalhas, resultados, mas será que eu estou realmente deixando um esporte melhor para aqueles que estão vindo depois de mim? Será que eu posso fazer mais? E acho que essa é a forma de fazer mais”, disse Aline Silva ao Olimpíada Todo Dia.
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“Não é sacrifício nenhum estar na Confederação, visto que o wrestling é tudo que eu vivo, que eu penso. Então, é mais fácil estar próximo, pensando em soluções e trabalhando para isso. A gente viu nesse momento a oportunidade de não ficar só reclamando e partir para tentar fazer efetivamente alguma mudança. A mudança que eu quero ver”, completou.
Representatividade feminina
Além do cargo em si e das possibilidades que ele tem para o desenvolvimento do wrestling, em um país ainda tão desigual como o Brasil, com poucas mulheres em cargos de direção e gestão, Aline Silva quebra uma barreira importante. E mostra que é possível ocupar esses e quaisquer espaços.
“Eu acabei entrando na chapa porque eles insistiram muito e sempre frisaram o quão importante eu seria. Talvez para eles, que trabalham comigo o tempo todo, o ser mulher não veio à mente em momento algum. Eles já reconheciam o meu valor. Agora tenho que mostrar para o resto que além de atleta, eu sou uma boa gestora”.
“No mundo da luta, um esporte super machista pelas raízes, é importante a gente começar a quebrar isso e mostrar que as possibilidades vão além. As mulheres trazem medalhas, mas temos que mostrar que elas também precisam ocupar os cargos de trabalho, como técnicas, em equipes multidisciplinares, gestão e tudo mais. Quem sabe a gente abre mais os olhos e as possibilidades para outras se verem e ocuparem esses espaços”, acrescentou.
Pela voz dos atletas
A eleição da CBW, no entanto, foi conturbada, após a chapa encabeçada por Carlos Magno Barros da Silva (presidente da Federação do Rio de Janeiro) tentar impugnar a votação no mesmo dia e na semana anterior, quando alegou que os atletas paulistas não poderiam votar, porque a federação do estado estaria irregular. A Justiça acabou negando a liminar e a chapa Keep Wrestling foi eleita com 26 votos, contra seis da chapa de Magno Barros, e três da liderada por Sergio Roberto Lara de Oliveira.
O ocorrido, entretanto, traz à tona a discussão sobre a representatividade dos atletas dentro das confederações. Até pouco tempo atrás, apenas um atleta tinha direito a voto em eleições. Mas uma mudança recente na Lei Pelé prevê que para que as entidades esportivas possam receber o repasse de recursos públicos, é necessário que no colégio eleitoral a categoria de atleta possua o equivalente a, no mínimo, 1/3 dos votos, garantindo maior voz aos envolvidos.
“Quando a Comissão de Atletas tinha um representante, aquele voto não representava o todo e na prática nossa voz não era tão ouvida. Porque tudo tem interesse. Por que eu [presidente] vou dar atenção a um atleta ao invés de ouvir um presidente de federação que pode me tirar do cargo? Então essa lei veio para mudar tudo. Se somos nós os maiores interessados e os mais importantes do esporte, porque é a gente que faz isso tudo acontecer, nada mais justo do que a gente ter voto com peso”, pontuou Aline Silva.
Mais do que “só” atleta
A chapa de Aline Silva, formada inteiramente de atletas, com Flávio Cabral e Waldeci Silva de Sousa, presidente e primeiro vice, respectivamente, precisou, no entanto, enfrentar desconfianças durante a campanha, com questionamentos se atletas poderiam conduzir uma boa gestão.
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“Muita gente falava que títulos não garantem mudança no esporte. O que garante é uma boa gestão. Ou olhava para mim e via apenas a atleta, que talvez não saiba nada de gestão. Mas talvez eles é que estavam mal informados. Eu tenho um projeto social [Mempodera] gerido por mim e pela minha mãe e fico muito feliz com os resultados que estamos tendo. Então para mim também foi uma oportunidade de mostrar que a gente pode fazer sim mais do que competir”, concluiu.