Mauricio Souza tentou driblar a determinação do Minas Tênis Clube de se retratar sobre posições de homofobia que postou na conta pessoal dele no instagram. Primeiro publicou uma, lacônica, no Twitter, rede em que praticamente não tem seguidores contra os cerca de 250 mil que tinha no instagram. Diante da não aceitação do clube, pressionado por patrocinadores, subiu um vídeo no insta com a retratação, mas deixando claro que estava fazendo aquilo não em reconhecimento ao erro, mas por pressão. Ao final da quarta-feira (27), teve contrato rescindido pelo clube, que já o havia afastado, e também foi descartado da seleção brasileira de vôlei pelo técnico Renan Dal Zotto.
A pressão em cima de Mauricio Souza tem origem em uma publicação do jogador, no mesmo instagram, sobre o anúncio da produtora de história em quadrinhos DC Comics de que o novo Super-Homem será bissexual. Maurício utilizou a rede sociais para tecer criticas. “‘Ah, é só um desenho, não é nada demais’. Vai nessa que vai ver onde vamos parar…”, publicou em 12 de outubro. Não foi a primeira vez. Um dia antes, escreveu “o céu e limite se deixarmos! Está chegando a hora dos silenciosos gritarem”, em cima de um anúncio da Rede Globo comunicando que usará pronome neutro em uma novela. Os comentários da postagem vêm carregados de homofobia, muitos deles curtidos pelo jogador. Em outra postagem, datada de 19 de setembro, coloca uma foto da porta de um banheiro da OAB-PE com os dizeres “Sinta-se à vontade para utilizar este banheiro de acordo com a sua identidade de gênero”. Maurício escreve: “Quero saber a opinião de vocês! A minha já sabem”. Novamente uma enxurrada de comentários homofóbicos, sem contestação dos atleta e com muitas curtidas dele. Há outras no perfil com o mesmo cunho. O central também deixa claro em várias outras publicações seu apoio ao presidente Jair Bolsonaro, declaradamente homofóbico.
Medidas cabíveis
Na terça-feira (27), a Fiat cobrou do time de vôlei mineiro “medidas cabíveis e necessárias no espaço mais curto de tempo” e declarou “repúdio a toda e qualquer expressão de cunho homofóbico”. Pouco depois, a Gerdau, também patrocinadora do time, foi na mesma linha deixando claro que “repudia qualquer tipo de manifestação de cunho preconceituoso ou homofóbico”. Ambos citam nominalmente Mauricio Souza. A montadora e a indústria de aço estampam suas marcas em destaque na camisa do Minas. A crise chegou ao clube, que determinou o afastamento a retratação do jogador. Ainda naquele dia, o central foi ao Twitter, rede onde até então tinha cerca de 50 seguidores, e escreveu uma nota sem explicar exatamente o motivo do pedido de desculpas. “Pessoal, após conversar com meus familiares, colegas e diretoria do clube, pensei muito sobre as últimas publicações que eu fiz no meu perfil. Estou vindo a público pedir desculpas a todos a quem desrespeitei ou ofendi, esta não foi minha intenção.” Não colou, e tanto a Fiat quando a Gerdau, de acordo com o jornalista Demétrio Vecchioli, do Olhar Olímpico, exigiram a retratação no instagram.
Homofobia não é opinião
Mauricio Souza teve de ceder, mas não o fez por completo. No vídeo de 3min38, publicado por volta das 15h30 desta quarta, ele pede desculpas não pela homofobia, mas “a todos que se sentiram ofendidos pela opinião, por defender aquilo que acredito”. A seguir, afirma que tem o direito de defender o que acredita. Diz que respeita todos com quem jogou e chega a gaguejar, duas vezes, ao falar a palavra “homossexuais”. A partir daí, ainda antes do primeiro minuto da publicação, começa a se colocar como vítima e volta a usar tom homofóbico. “Fico triste com o que está acontecendo, porque infelizmente a gente não pode dar opinião, não pode mais colocar os valores acima de tudo, valores de família, mas os valores de vocês a gente tem de respeitar a qualquer custo senão a gente é taxado como homofóbico. Eu não concordo com isso. A vontade de vocês (vídeo) foi essa e ela está sendo acatada”. Ele segue: “os patrocinadores repudiaram, eu não sei o que eu fiz, se foi algum crime, se fosse eu já estava preso. A polícia já tinha vindo aqui em casa me prender. Acho que não foi crime nenhum.”
Além dos patrocinadores, diversos atletas do vôlei foram às redes criticar o jogador. Carol Gataz, assumidamente bissexual, e capitã do time feminino do Minas, publicou na tarde de terça-feira “Homofobia é crime”, e seguiu: “já toleramos desrespeito, gracinhas e preconceitos disfarçados de opinião por muito tempo. Chega!” No dia seguinte, em vídeo, repetiu os dizeres e seguiu tecendo críticas pesadas à postura do jogador. “Enquanto as pessoas mascaram esse preconceito como forma de opinião, as pessoas são mortas nas ruas. Se a sua opinião oprime, mata, limita o outro de existir, você não é livre para expressá-la. É crime, tá na lei.” Recebeu apoio de atletas do vôlei e de outras modalidades, como Bia Ferreira e Hebert Sousa, do boxe, e de ex-atletas, como Joanna Maranhão, da natação. Sheilla Castro, do vôlei, e Fabi Alvim, ex-líbero, também foram às redes postar “homofobia é crime”.
Douglas Souza, jogador da seleção brasileira de vôlei assumidamente gay, também se colocou de forma enfática, na terça-feira. Agradeceu à Fiat por a montadora entender “que homofobia não é liberdade de expressão ou opinião”. Ele seguiu, porém, pessimista em relação aos possíveis desdobramentos do caso. “O famoso não vai dar em nada, né? Toda vez é a mesma coisa, cansado disso, de sempre ter falas criminosas e no máximo o que rola é uma multa e uma retratação nas redes sociais. Até quando?”. Neste caso, foi até esta quarta-feira. Minutos após a publicação de Mauricio Souza no instagram, o Minas anunciou que o central não jogaria mais pelo time. Um pouco antes, o jornal O Globo publicava matéria da jornalista Carol Knoploch com Renan Dal Zotto fechando as portas da seleção para o central. “É inadmissível este tipo de conduta do Maurício e eu sou radicalmente contra qualquer tipo de preconceito, homofobia, racismo. Em se tratando de seleção brasileira, não tem espaço para profissionais homofóbicos.”