Tóquio – Até os Jogos Pan-Americanos de Lima, em 2019, a rival que não saia do foco da boxeadora Bia Ferreira era Rashida Ellis. A representante dos Estados Unidos havia cometido a audácia de derrotar a brasileira meses antes e pagou o preço de entalar na garganta de Bia. Foi derrotada tanto naquele Pan quanto no Mundial disputado também em 2019. Agora, nos Jogos Olímpicos de Tóquio, a presa da vez é a irlandesa Kellie Harrington, atleta com quem nunca trocou golpes nos ringues. Porém, não é a única. Bia sabe que para garimpar o ouro que tanto persegue no boxe terá de encarar todas as adversárias da mesma maneira na categoria até 60 quilos.
A baiana de Salvador tem 28 anos e é filha de Raimundo Ferreira, o ‘Sergipe’, bicampeão brasileiro de boxe. Acumula nada menos do que 28 pódios em 29 competições desde 2017, com apenas cinco derrotas em mais de uma centena de lutas. Fora isso, 40% das vitórias foram pelo chamado RSC, como se fosse o nocaute. Além do Mundial e do Pan, é atual bicampeã do Strandja Memorial, tradicionalíssimo torneio disputado na Bulgária, campeã do Feliks Stamm, da Polônia, do Grand Prix Usti, na República Checa, e da Cologne Boxing World Cup, na Alemanha. Falta apenas o ouro olímpico para completar a coleção ou, como gosta de dizer, “zerar o joguinho”.
“A Beatriz vem em um desenvolvimento muito rápido nas questões de números desde que começou na equipe olímpica permanente do Brasil. Ela foi chamada em 2016 para ser a sparring da Adriana Araújo, que era a nossa medalhista olímpica, e já nos primeiros meses foi notada uma característica, principalmente na potência e na força dos golpes. O que diferenciava ela das meninas dos 60 quilos”, explica Mateus Alves, técnico da seleção, acrescentando que já naquela época, mesmo em início de desenvolvimento, Bia já conseguia se equiparar a Adriana, dona de um bronze em Londres-2012.
Maior Rival
Kellie Harrington, com 31 anos, também tem um baita cartel. Foi campeã mundial em 2018 e vice em 2016, sendo esta prata conquistada uma categoria acima da que compete agora. Assim, foi a primeira atleta irlandesa a medalhar em duas categorias diferentes em campeonatos mundiais. No ano de 2019, quando Bia Ferreira praticamente não encontrou quem a pudesse vencer, Harrington sofreu uma lesão no pulso, o que a deixou fora de combate inclusive do mundial vencido pela brasileira. Agora em 2021, porém, voltou com força e foi a campeã da forte seletiva europeia para os Jogos Olímpicos.
“Realmente a gente tá colocando a irlandesa como a maior rival. Ela é uma atleta alta, que joga com as duas guardas, tanto destra como canhota, boxeia tanto na meia-longa distância, movendo para trás, quanto o boxe para frente. Não tem uma curta distância muito boa, que é o nosso diferencial, mas é uma atleta bem perigosa. Fez um Mundial excelente em 2018, vencendo algumas atletas que eram favoritas na época”, analisa Mateus.
Dubois, Yeonji, Kaur, Potkonen e, claro, Rashida
A irlandesa, porém, não é a única atleta no caminho de Bia Ferreira. A jovem britânica Caroline Dubois, de 20 anos, também está no radar da comissão técnica brasileira. Ela fez a final da seletiva olímpica europeia contra Harrington. Outra rival é a sul-coreana Oh Yeonji, de 30 anos, terceira colocada no Mundial de 2018 derrotando a brasileira na segunda rodada no único torneio em que Bia não foi ao pódio. É primeira atleta daquele país a ser campeã asiática, em 2018. Mateus e Bia estão de olho, ainda, na indiana Simranjit Kaur, 26 anos, bronze no Mundial de 2018, mas uma categoria acima, até 64 quilos. A finlandesa Mira Potkonen, apesar dos 40 anos, não foi descartada, pois foi medalhista olímpica de bronze na Rio-2016. Rashida, é bom dizer, está no torneio de boxe de Tóquio.
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Toda avaliação das adversárias é feita pela comissão técnica. Claro que Bia Ferreira participa do processo, mas claramente o negócio dela é no tablado. Quando questionada sobre as rivais em Tóquio, não titubeia. “Todas são minhas adversárias. Todas são um perigo e eu estou esperta para todas. Eu nunca enfrentei (a irlandesa), admiro muito, gosto do estilo de boxe e estou pronta. Se for para acontecer (o combate com ela), vai acontecer e vai ser um espetáculo enorme para a galera”, fala, com a confiança de sempre. Já em Tóquio, afirma que está “sendo tudo muito mágico. Eu visualizei várias situações aqui, enquanto a gente estava na pandemia, e estou tentando aproveitar ao máximo, com foco, cada segundo para aprimorar. Para quando chegar lá na minha vez de estar mostrando o espetáculo sair tudo certo”. E a pressão, Bia? “Eu fico feliz que tem um bocado de gente que confia no meu trabalho, eu não levo como pressão, só levo como uma força a mais. Eu sei o motivo que eu treinei, onde eu quero chegar.”