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Tóquio 2020

Japão e Brasil seguem rumos opostos no trato da pandemia de covid-19

Mesmo com números infinitamente menores, país asiático amplia restrições, tira público dos Jogos e sacrifica receita. Já no Brasil, limitações vão ficando ainda mais leves, mesmo com crise fora de controle

Jogos Olímpicos restrições Brasil Japão
Jogos serão sem público no Japão (Si B/Flickr)

Tóquio – Mesmo às vésperas do maior evento esportivo do mundo, onde investiu a bagatela de US$ 16 bilhões, o governo do Japão não se furtou a determinar restrições mais duras para conter a pandemia da Covid-19, que vão vigorar durante todos os Jogos Olímpicos. Uma das consequências é a eliminação completa de público nas competições e, com ela, a abdicação de receitas que ajudariam a cobrir o custo, o terceiro mais alto da história. Isso em um cenário com média móvel diária de casos da doença em torno de 850 e de mortes abaixo de 20. Situação diferente do Brasil, que liberou a presença de 10% de público para a final da Copa América, mesmo com um cenário com aproximadamente 47,5 mil casos e 1,4 mil mortes por dia na média semanal.

O aumento das restrições no Japão foi anunciado cerca de 15 dias antes do começo dos Jogos e vale para Tóquio, sede da Olimpíada, e mais algumas localidades. É a quarta vez que o governo impõe o chamado estado de emergência e ele vai vigorar entre 12 de julho até 22 de agosto pegando, portanto, todo o período de competições, marcadas para começar em 21 de julho e terminar em 8 de agosto. Com isso, foram enterradas as possibilidades da presença do público nas arenas olímpicas. Até então, havia a liberação de 50% da capacidade, limitada a 10 mil espectadores locais. A presença de torcedores estrangeiros já havia sido vetada, independentemente das medidas restritivas. A perda de receita é considerável, já que o preço dos tíquetes variava de US$ 25 a US$ 1,3 mil.

Futebol, cerveja, karaokê e saquê

As medidas restritivas, importante dizer, estão ligadas ao horário de funcionamento de bares e restaurantes e na venda de bebidas alcoólicas. O que o governo japonês quer é evitar a combinação entre aglomeração e consumo de álcool nos Jogos Olímpicos, vista como potencialmente perigosa para a disseminação do vírus. Não é difícil entender o motivo, basta observar como a euforia das pessoas aumenta na mesma proporção do consumo de álcool e, com ela, a emissão de vírus para o ambiente e de relaxamento dos cuidados básicos, como uso de máscara e distanciamento.

Apesar da clareza sobre o risco de misturar o consumo de álcool com aglomeração em tempos de crise sanitária, no Brasil os governos dos dois principais estados seguem no sentido contrário do tomado pelos japoneses. Em São Paulo, por exemplo, as restrições estão mais leves desde sexta-feira (9). Bares, além de restaurantes, padarias, comércios e outros serviços, foram liberados para ficar abertos até às 23h e podem, agora, preencher até 60% da capacidade. Antes era 40%. O número de casos e mortes por Covid-19 no estado, que tem cerca de 44 milhões de habitantes, é de 3,85 milhões e 132 mil, respectivamente. Se fosse um país, seria o 12º com mais casos no mundo. O Japão inteiro, com 126,3 milhões de moradores, tem cerca de 815 mil casos e perto de 15 mil mortes. É o 34º em casos.

O Rio de Janeiro, com cerca de 16,6 milhões de habitantes, também tem mais casos e óbitos que o Japão. São cerca de 978 mil com 55,5 mil mortes. Mesmo assim, as autoridades não se furtaram em permitir que a final da Copa América seja realizada no Maracanã com a presença de público. Serão cerca de 7,8 mil pessoas, equivalente a 10% da capacidade do estádio. Além disso, desde maio são permitidos o funcionamento de bares e rodas de samba sem limite de horário e com mais mesas liberadas para o uso, estimulando que mais pessoas se aglomerem para beber juntas. Exatamente o que o governo japonês está cortando com as restrições impostas.

“A vida é mais importante do que uma medalha de ouro”, resumiu Satoshi Horiuchi, cidadão japonês que, ao lado de três companheiros, chegou a entrar com uma ação na Justiça, na sexta-feira, para tentar cancelar os Jogos Olímpicos. Não é preciso nem esperar para saber o que vai acontecer no Brasil e no país asiático. O passado já cansou de mostrar. Os números friamente estão aí para fazer esse papel. Basta olhar.

*com Kyodo News e Japan Times

Jornalista com mais de 20 anos de profissão, mais da metade deles na área de esportes. Está no OTD desde 2019 e, por ele, já cobriu 'in loco' os Jogos Olímpicos e Paralímpicos de Tóquio, os Olímpicos de Paris, além dos Jogos Pan-Americanos de Lima e de Santiago

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