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Tóquio 2020

De casa nova, Vitória Rosa é grata a oportunidades do atletismo

Em live com o OTD, Vitória Rosa contou sua história de vida e destacou as oportunidades provenientes do esporte

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Vitória Rosa já está garantida nos Jogos Olímpicos de Tóquio (Alexandre Loureiro/COB)

Irmã de outras sete mulheres, sendo uma falecida, Vitória Rosa viu no esporte oportunidades para a vida. Agarrando cada uma delas como se fosse a passagem de um bastão durante uma competição de revezamento, a velocista que corre os 100 e os 200 metros conheceu vários países, esteve nos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro, construiu uma casa e hoje agradece ao atletismo por tudo conquistou.

O começo, porém, não foi nas pistas, mas nas quadras. Antes de conhecer o atletismo, praticou handebol. Vitória Rosa conheceu as pistas quando a professora da escola em que estudava levou as alunas para brincar na caixa de areia, o que no alto rendimento se equivale ao salto em distância. Com sua velocidade, Vitória Rosa se destacou e saltou longe. A professora, então, falou algo que a velocista se lembra até hoje: “O atletismo pode te dar muito mais oportunidades do que o handebol’.

Vitória Rosa passou a alternar treinos nas duas modalidades. Pela manhã, sob o comando da professora, jogava handebol. De tarde, quando tinha o tempo livre, ia para pista de atletismo com suas irmãs. Até que a professora veio com a notícia de que havia surgido uma bolsa para que uma aluna deixasse a escola pública para estudar em uma instituição particular.

“Aquele momento era para eu decidir minha vida, só que a bolsa era para o atletismo, não para o handebol. Tomava um rumo ou tomava outro. Eu falei: ‘Eu quero’. Me joguei”, disse, durante uma live no Instagram do Olimpíada Todo Dia.

Trauma familiar

Na mesma época em que Vitória Rosa ganhou a bolsa na escola particular, a família passou por um momento complicado. O pai da carioca ‘escapou’ da morte por um acaso. Indo pescar com alguns amigos em uma Kombi, o motorista passou mal. Ele estava no banco do passageiro e assumiu o volante. Em um cruzamento, uma carreta não viu a Kombi e bateu de frente.

“O cara que estava do lado do meu pai veio a falecer. Deu perda total no veículo. Depois disso, meu pai nunca mais foi pescar. Vi ele vender peixe na rua, mas pescar nunca mais”, disse Vitória Rosa.

Com o pai acidentado e crianças para criar, a mãe teve que trabalhar. Como a família morava em Santa Cruz, bairro mais distante do centro do Rio de Janeiro, ela tinha que pegar três conduções para chegar ao emprego. Ao mesmo tempo, Vitória Rosa precisava de uma passagem para ir à escola.

“Ela pegava esse dinheiro da condução e me dava. Ia e voltava andando em algumas partes. Mesmo acidentado, meu pai passou a vender peixe e as coisas melhoraram com o tempo. Ele conseguiu ajudar também”.

Mudança de rumos

Durante quase dois anos, Vitória Rosa se dividiu entre os estudos na escola particular e o Projeto Marinha do Brasil-Odebrecht no Centro de Educação Física Almirante Adalberto Nunes (Cefan), que era focado em revelar talentos para os Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro.

“No meu terceiro ano na escola particular, eu já não estava aguentando, porque era uma rotina puxada, totalmente diferente de uma escola pública. Eu estava tendo muitas faltas por conta das competições, era uma atrás da outra. Conversei com meus pais e voltei para a escola pública”, contou a atleta, que deixou o salto em distância, chegou a ser barreirista e encontrou os melhores resultados nas provas de velocidade.

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Por conta da rotina cada vez mais corrida, literalmente, devido aos treinos e às competições, a velocista passou a morar no Cefan, onde tinha professores, trabalhos e apostilas. Deste modo, a melhor saída foi encerrar o Ensino Médio através de um supletivo.

Mistura de sentimentos

De casa construída e classificada aos Jogos Olímpicos, Vitória Rosa agradece oportunidades conquistadas através do atletismo
Vitória Rosa conquistou um ouro e duas pratas no Pan de Lima (Abelardo Mendes Jr/ rededoesporte.gov.br)

Vitória Rosa esteve nos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro e viveu um misto de sentimentos. Criou uma relação ‘de pai para filha’ com o treinador Robson Alhadas. Ele, entretanto, tinha um outro sonho, que era se formar em Medicina. Após ter o pedido de demissão negado por um comandante do Cefan em 2015, ficou definido que o técnico deixaria o cargo em definitivo após os Jogos Olímpicos do Rio.

“Ele era como se fosse um outro pai para mim. Era um companheiro. Para mim, ele foi até mais que um pai, porque eu me sentia aberta para conversar com ele. Ele me dava vários conselhos. Foi assim que esse relacionamento entre atleta e treinador foi se construindo”, disse, contando uma reflexão que fez quando estava na Vila Olímpica e caiu a ficha de que representaria o Brasil no maior evento esportivo do mundo.

“Eu pensei: ‘Quero sempre estar aqui’. Foi um momento de bastante alegria e tristeza, porque eu também ficava pensando: ‘e depois que acabar tudo isso? Para onde eu vou? Como vai ser minha vida?’”, completou.

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Prestes a ter que parar de trabalhar com o treinador que criou um vínculo afetivo, Vitória Rosa ainda precisava lidar com a situação da mãe, que estava internada com anemia e um mioma. Robson Alhadas, então, tranquilizou Vitória Rosa.

“O Robson me disse: ‘Aproveita esse momento, é único, oportuno. Todo atleta sonha em chegar aqui. Com você não é diferente’. Para mim era diferente, porque em nenhum eu me via uma atleta de alto de rendimento. Foi nesse momento que eu absorvi tudo que ele disse. Eu não sonhei em estar aqui, mas pela graça de Deus, eu estou”, disse.

Vitória Rosa seguiu os conselhos do mentor, aproveitou a experiência olímpica e, com o tempo, os questionamentos sobre o futuro foram respondidos: ela estará em mais uma Olimpíada. A velocista está classificada para os 200 m, sua principal prova, e briga por vaga nos 100 m do atletismo nos Jogos Olímpicos de Tóquio.

De casa nova

Mulher mais rápida do Brasil na atualidade, Vitória Rosa estabeleceu novos questionamentos em sua mente. Esses, contudo, não têm resposta.

“Às vezes, eu penso: ‘Se eu não fosse atleta, como seria minha vida?’. Eu fico tentando puxar isso na mente. Será que eu teria as grandes oportunidades que eu tive sem estar no esporte? O esporte me abriu muita coisa. Será que minha família teria condições de pagar viagens para todos os lugares que já conheci? É a mesma coisa a minha casa”, afirmou.

De qualquer modo, Vitória Rosa segue aproveitando com passadas largas as oportunidades que o esporte, especialmente o atletismo, deu e dá. A carioca colocou a mão na massa e, aos 24 anos, construiu sua primeira casa no bairro em que nasceu.

“Eu peguei o Bolsa Atleta, um dinheiro ali, outro aqui e fui juntando, porque eu queria construir minha casa. Comecei do zero, primeiro comprei terreno. Depois, juntei dinheiro para construir minha casa. Começamos tudo zero. Baixei um aplicativo, coloquei os cômodos e consegui um pedreiro. E foi assim que construí minha casa. Tem muita coisa melhorar, mas foi um passo enorme”, finalizou.

Jornalista formada pela Cásper Líbero. Apaixonada por esportes e boas histórias.

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