“Eu fiquei bastante perturbado quando assisti na televisão. Eu vi quanto de pressão estava sobre ela. Na minha vida de atleta, conheci um pouco de pressão, mas o que vi estava além da minha imaginação”. Essa frase se refere ao programa longo da patinação artística feminina em Pequim 2022 e não foi dita por um jornalista ou torcedor, mas por Thomas Bach, presidente do COI.
A declaração foi dada em entrevista coletiva nessa sexta-feira, dia 18, horas após a definição da prova entre as mulheres. No centro de um escândalo de doping, a jovem russa Kamila Valieva, de 15 anos, não suportou a tensão e sucumbiu. Cometeu erros que normalmente não cometeria em suas apresentações e ficou fora do pódio.
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Foi o ponto final de uma semana que colocou em xeque não apenas o controle antidoping russo, mas todo o universo da patinação artística. Antigas histórias e denúncias de abusos em treinamentos vieram à tona novamente. São situações extremas em busca da superação de limites, como os saltos quádruplos.
A ISU, órgão máximo do esporte, vai ter que encarar seus próprios fantasmas. Afinal, o órgão tentou proibir a participação de Valieva nos Jogos Olímpicos por conta do doping, mas nomeou a técnica Eteri Tutberidze, responsável legal por ela segundo o código mundial antidopagem, como treinadora do ano em 2020.
Patinação artística não corre riscos, mas precisa fazer autocrítica
Quando um escândalo de doping acontece nessa proporção, evidentemente o esporte fica na berlinda. Além disso, as reações das atletas russas após a definição das medalhas na disputa feminina da patinação artística tampouco ajudaram. Além de Valieva, Alexandra Trusova demonstrou descontrole mental ao ficar com a prata em vez de ganhar o ouro.
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“Estava ponderando isso ontem à noite sobre a comitiva ter sido tão gelada com a atleta. Depois, quando li os comentários sobre a Alexandra Trusova, minha impressão não estava errada. Tudo isso não me dá muita confiança nas pessoas mais próximas de Kamila”, afirmou Thomas Bach.
Quando o próprio presidente do COI diz isso, ainda que por mera retórica, é preciso ligar o sinal de alerta. Pesa a favor do esporte o fato de casos de doping não serem tão frequentes (como são no levantamento de peso) e por ser uma das campeãs de audiência em todo o mundo. Mas mudanças terão que acontecer para que essa história não se repita mais.
Pontos de reflexão para o universo da patinação artística
A chance da patinação artística de sair do programa olímpico é nula, mas certamente a experiência vivida em Pequim 2020 ainda vai ter desdobramentos. A ISU não fez nenhum comunicado em seus canais oficiais, mas já se comenta a necessidade de revisar inúmeros processos tão logo acabe essa temporada, em maio.
Alguns pontos são operacionais, como a agilidade nos testes de doping em campeonatos importantes, como é o Nacional Russo em ano de Jogos Olímpicos. Outros são mais críticos e despertam paixões entre atletas, treinadores e dirigentes, como a redefinição de idade mínima e até mesmo o código de notas que valoriza mais os saltos do que a parte artística.
Há também a necessária supervisão de técnicos ao redor do mundo. “Não somos a polícia, não podemos interrogar as pessoas”, comentou o presidente do COI aqui em Pequim 2022. Mas é dever da ISU criar ferramentas de controle que coíbem abusos de todos os seus membros filiados e que proteja, física e mentalmente, seus jovens atletas.
Entenda o caso que manchou a patinação artística
Kamila Valieva testou positivo para trimetazidina em 25 de dezembro. A substância é indicada para problemas cardíacos, mas proibida pela Agência Mundial Antidopagem (WADA) por facilitar a circulação sanguínea. Entretanto, a Rusada, laboratório russo, só obteve os resultados dia 8 de fevereiro. Ou seja, após a disputa por equipes e antes da prova individual em Pequim 2022.
Inicialmente, o órgão a proibiu preventivamente, o que a tiraria da prova individual da patinação artística nos Jogos Olímpicos. Porém, retirou a decisão após apelação do corpo técnico da atleta no dia seguinte. COI, WADA e ISU entraram com representação no CAS para retomar a suspensão da atleta.
Após quatro dias, o órgão manteve a liberação de Valieva alegando “danos irreparáveis” que a suspensão poderia trazer em sua carreira. Como resposta, o Comitê Olímpico Internacional afirmou que não faria entrega de medalhas se ela subisse ao pódio. A quarta posição da russa garantiu a cerimônia de premiação, mas encerrou uma das páginas mais vergonhosas da história da patinação.
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