PARIS – Cada um a sua maneira, Gustavo Carneiro e Daniel Rodrigues sonhavam jogar um dia na Philippe Chatrier, a quadra central do complexo de Roland Garros, onde Gustavo Kuerten fez história ao ganhar três vezes o Aberto da França. O feito aconteceu nas quartas de final do torneio de duplas do tênis em cadeira de rodas dos Jogos Paralímpicos de Paris-2024. Eles não conseguiram seguir na disputa pela medalha, mas ficaram com o sentimento de que podem viver aquilo novamente. Estar presente nos Grand Slams do circuito mundial não é algo tão distante quanto parecia até antes deles chegarem à capital francesa.
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“Eu lembro do coração que o Guga fez na quadra (depois do título de 2021). Falei, poxa, será que eu também chamo Gustavo, né? Fiquei sonhando de fazer nessas quartas de final. E a gente estava muito perto, né? Já tava aqui pra disputar, então, eu lembrei muito disso do Guga aqui”, afirmou Gustavo Carneiro, xará do tricampeão de Roland Garros.
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Um filme na cabeça
Quando Guga ganhou seu último Grand Slam, Gustavo Carneiro tinha 28 anos. O sonho de virar tenista profissional tinha acabo na adolescência. Natural de Uberlândia, ele chegou a ser convidado para treinar em São Paulo quando tinha 14 anos, mas, por questões de família, não seguiu em frente. Em 2021, já estava em outra carreira. Mas quis o destino que ele voltasse ao tênis. Em 2017, teve que amputar uma das pernas por causa de um tumor. Viu naquilo que seria uma tragédia para qualquer pessoa, uma oportunidade. Ingressou no tênis em cadeira de rodas e sete anos depois completou sua segunda participação em Jogos Paralímpicos.
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“Foi tudo isso que fez tremer a hora que eu cheguei em Roland Garros. A hora que eu vi a quadra, que eu vi a torcida e aí começou a passar o filme na minha cabeça, né? O Gustavo lá de 14 anos e depois o Gustavo de quando amputou a perna há sete anos, né? Mês que vem completa sete anos que eu amputei. Eu estava num momento triste da minha vida e, de repente, eu estou num jogo de quartas de final das Paralimpíadas disputando uma vaga na semifinal na Philippe Chatrier. Foi um momento
maravilhoso que, até a hora que eu saí da quadra, eu fiquei olhando tudo porque ser a última vez que eu entro nela. Espero que não, mas, se for, eu queria guardar muito bem na minha memória esse momento que eu vivi. É o sonho de todo tenista, pisar numa quadra dessa, jogar numa quadra dessa. E eu joguei um jogo muito importante. Feliz demais”, revela Gustavo Carneiro.
História diferente
Diferente do companheiro, Daniel Rodrigues não tem uma longa história com o tênis. Ele nasceu com uma má formação na perna direita, que era 20 centímetros menor do que a esquerda. Em 2015, decidiu amputá-la. Foi nessa época, aos 19 anos, que conheceu o esporte, quatro anos depois da última vez em que Guga foi campeão em Roland Garros.
“Nunca tinha passado pela minha cabeça jogar tênis. Eu comecei com 19 anos através de uma ONG. Já tinha ouvido falar do Guga, mas não tinha nem contato com a modalidade para falar a verdade. Foi só depois que eu passei a jogar mesmo e a viajar que eu passei a sonhar mais com esse esporte. Eu fui conhecendo o tênis e agora eu entendo o que foi o Guga e o que é jogar aqui em Roland Garros. Foi um sonho que eu quero levar isso para sempre também. Se eu penso lá atrás em tudo o que eu passei, eu fico feliz só de participar. A verdade é essa”, diz Daniel Rodrigues.
Grand Slam é realidade
Mas ter realizado o sonho de jogar na Philippe Chatrier deixou tanto em Gustavo Carneiro quanto em Daniel Rodrigues um gostinho de quero mais. Enquanto Daniel é o atual 19º do mundo, Gustavo é o 37º. Numa chave de Grand Slam, entram 16 tenistas.
“Na nossa categoria entram 14 direto e mais dois por convite”, conta Daniel Rodrigues, mas lembra que há até bem pouco tempo não era assim. “Quando eu era o 11º do mundo, só entravam oito no Grand Slam. Isso mudou há pouco tempo”, lembra. Mas o fato da chave ter sido aberta para mais gente, enche os brasileiros de esperança, ainda mais depois do que viveram nos Jogos Paralímpicos de Paris-2024.
“Muita gente agora começou a ter o sonho porque com oito era só uma panela, né? Agora com 16 dá para acreditar”, completou Gustavo Carneiro.