Jogos Olímpicos nem sempre se tratam de resultados e medalhas. O maior evento esportivo do planeta também é sobre realizações e sonhos. Esse é o caso de Gabriele Santos, atleta do salto triplo que “representou muita gente” ao fazer sua estreia em Paris-2024. Nascida em uma comunidade no Rio de Janeiro, ela teve o sonho olímpico alimentado pelos pais, que, mesmo desempregados, se esforçavam e encontravam saídas para pagar viagens e competições para a filha.
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“Eu já entrei na pista sabendo que eu tinha conquistado algo muito grande porque essa é a minha primeira Olimpíada e eu esperei 20 anos por isso. A menina que começou correndo nas ruas da comunidade, que as pessoas diziam que não ia ser nada, que ia ter filho na adolescência e que a família não prestava para nada, chegou em uma Olimpíada”, falou a atleta de 29 anos após sua prova eliminatória, que aconteceu na sexta-feira (02).
Gabriele Santos terminou sua participação em 27º lugar, com a marca de 13,63m. Ela queimou a primeira tentativa, realizou o melhor na sequência e depois anotou 13,48m. O desempenho a deixou distante de uma briga para final, mas mais do que o resultado, a presença da saltadora em uma Olimpíada já significou muito para ela e para muita gente.
“Eu venci muitas questões sociais para estar aqui, estou representando muitas pessoas. Eu estou aqui representando pessoas pretas, pobres, faveladas, meninas que vêm sem condições sociais, pessoas que não têm perspectiva de futuro. Tem uma questão muito maior do que o esporte aqui. O esporte muda vidas. Eu nunca imaginei que eu estaria em uma Olimpíada e tudo isso mudou para mim. Eu sei que eu sou vencedora por ter chegado até aqui”, disse.
O início
Gabriele começou no atletismo aos nove anos de idade, por meio de um projeto social que era realizado nas ruas atrás de sua escola. Seus professores a incentivaram a ir para lá depois que viram que ela se destacava nas aulas de Educação Física. Ela vivia em um cenário de prostituição, drogas e violência em Santa Cruz, bairro em que nasceu e viveu sua infância, e encontrou no esporte uma saída para isso.
“O esporte me abraçou. Eu lembro que quando eu comecei, era muito deslocada socialmente porque eu sempre fui grande, pretinha e para as pessoas meu cabelo era duro e meu nariz era grande. Só que quando eu conheci o esporte, entendi que o meu lugar era no esporte. Eu não era boa para alguns grupos sociais, mas eu era perfeita para o esporte. Até me emociono de falar disso”, falou a atleta, que chegou a perder amigas para o crack.
Gabriele teve dificuldades no início da trajetória, em especial no aspecto financeiro. Apesar disso, seus pais sempre deram um jeito de arrumar dinheiro e destinar uma parte para que Gabi pudesse ir às competições com tranquilidade. Ela lembrou de um episódio em que o pai pediu ajuda a estranhos para custear a viagem da filha para uma competição regional em Minas Gerais.
“Sou grata, principalmente, a duas pessoas: ao meu pai e à minha mãe. Porque, quando eu comecei no atletismo, meu pai e minha mãe eram duas pessoas desempregadas e sabe o que eles faziam? Bico no fim de semana para poder me dar dez reais para eu poder ir para uma competição. Eles são os maiores investidores do meu sonho. Essa vitória não é só minha”, lembrou.
“Quando eu tive a primeira convocação do meu campeonato nacional, lembro que meu pai estava desempregado e meu pai perguntou se eu queria ir e respondi que sim. Ele falou: ‘então a gente vai dar um jeito’. Ali, meus pais já entendiam a importância do esporte. Lembro que meu pai me pegou na mão, saiu batendo de porta em porta, de pessoas que ele nem conhecia, com as poucas medalhas que eu tinha na época, e começou a pedir ajuda, de pouco em pouco, cinco, dez reais”.
Depois de Paris, Los Angeles é logo ali
Gabriele sempre foi saltadora, e passou por salto em altura e salto em distância antes de se estabelecer no triplo. Ela saiu de casa aos 15 anos de idade para ir para Presidente Prudente, no interior de São Paulo. Depois, ficou em Bragança Paulista por dois anos, período em que passou dificuldades e chegou a pensar em largar o esporte, mas contou com o apoio da ex-corredora Liliane Parrela para seguir em frente. Logo em seguida, foi para o Pinheiros, onde está até hoje.
Em seu currículo, estão quatro títulos de Troféu Brasil e um título sul-americano. Ela ficou em quarto lugar nos Jogos Pan-Americanos de Santiago-2023 e também levou ouro nos Jogos Sul-Americanos de Assunção-2022. No ano passado, também disputou o Mundial de Budapeste, quando também não passou das eliminatórias. Depois de Paris-2024, ela já sonha com Los Angeles-2028, mas a caminhada é duradoura.
“Esse é o meu trabalho. Atletismo não é só o que eu sei fazer, é o que eu amo. Amo defender a bandeira do meu país, tenho o maior orgulho e a maior honra de representar o Brasil. A estrada é muito longa. Los Angeles não está logo ali, mas vai chegar. Ainda tem quatro anos para trabalhar, reajustar. Essa foi minha primeira experiência olímpica, mas não em campeonatos desse nível. Estou muito feliz e agradecida de estar aqui”, finalizou.