No mês passado, o Olimpíada Todo Dia noticiou a suspensão das atividades do Centro de Formação do CPB (Comitê Paralímpico Brasileiro), a escolinha de esportes da entidade, devido à pandemia de coronavírus. Cerca de 35 funcionários, entre professores, auxiliares e estagiários, receberam férias e seriam demitidos na sequência. Depois deste período, no entanto, esses funcionários ganharam mais um mês de trabalho, que se encerra no dia 5 de junho, quando todos devem ser desligados do CPB.
Com a suspensão das atividades no Centro de Formação do CPB por causa do coronavírus, cerca de 600 crianças e jovens com deficiência, de nove modalidades diferentes, ficaram sem ter aulas. Mas como alternativa para não deixá-los desamparados, a equipe de professores de atletismo tomou a iniciativa de retomar as aulas, mas de modo virtual. Assim, desde a semana passada, 49 alunos já puderam retornar às atividades físicas.
+ SIGA O OTD NO YOUTUBE, NOINSTAGRAM E NO FACEBOOK
E para entender mais sobre a importância do projeto do Centro de Formação do CPB para essas crianças e jovens, o Olimpíada Todo Dia conversou com algumas mães e filhos atletas que participam da escolinha. Confira.
Benefícios da escolinha
Maria Eduarda da Silva tem 16 anos e nasceu com paralisia cerebral. A mãe, Maria Aparecida, é professora de Educação Física e foi atrás de fisioterapia e terapia ocupacional desde que a filha tinha seis meses. O esporte entrou na vida de Duda, no entanto, depois que ela recebeu alta das terapias, como forma de manter o seu desenvolvimento.
Há dois anos, Duda e Maria Aparecida conheceram o Centro de Formação do CPB. Ela já passou por tênis de mesa, vôlei sentado e hoje está na equipe de atletismo.
“Para nós, é muito importante, porque a Duda tem uma grande dificuldade na escola de prestar atenção, ficar no lugar, concentrada. E no esporte, no CT Paralímpico, ela consegue se concentrar, porque é algo mais agradável e que ela tem mais facilidade”, contou Maria Aparecida. “Eu faço coisas que eu gosto e esporte é uma coisa que eu gosto”, completou Duda.
A situação é parecida com a de Matheus, de 17 anos, que tem Síndrome de Down, e João Pedro, deficiente visual, de 13 anos. Matheus está no Centro de Formação há um ano e desde o começo, se identificou com o atletismo.
“O Centro de Formação do CPB oferece uma oportunidade de nossos filhos estarem desenvolvendo outras atividades fora da escola. O atletismo para o Matheus, por exemplo, foi uma coisa nova e que ele gostou e gosta muito. Então Às terças e quintas, quando ele tem aula, são dias que ele sabe que vai treinar, brincar, ver pessoas como ele e com deficiências diferentes também. E isso é muito importante para eles”, relatou a mãe, Elizabeth Cecilio de Oliveira.
João Pedro, por sua vez, que compete nos 100 m e no salto em distância, está no Centro de Formação do CPB desde julho do ano passado e foi amor à primeira vista. “Quando fomos à escolinha, ele se apaixonou pelo atletismo e é o que ele quer levar para a vida dele”, contou sua mãe, Lucineide.
Saudades das aulas
Quando as aulas do Centro de Formação do CPB foram suspensas, a notícia foi um baque para as mães e os filhos. Em meio à pandemia de coronavírus, as crianças tiveram que adaptar suas rotinas e sentiram muito a falta das aulas e do convívio proporcionados pela escolinha.
“Senti muita falta, porque além de ser uma coisa que eu gosto de fazer, meus amigos estão lá, envolve um monte de coisa que eu senti bastante falta”, lamentou Duda.
“Foi muito triste quando a gente recebeu a notícia. Ficamos parados, de mãos atadas, sem poder fazer nada. E apesar de a gente gostar de esporte, de mexer com o físico, ela fica muito parada em casa. É complicado colocar eles para fazer algo dentro de casa”, acrescentou a mãe, Maria Aparecida.
O mesmo aconteceu com Matheus e Elisabeth. “A gente se viu sem nada para fazer, sem esporte para praticar… Então a gente entramos em uma rotina que a gente não está acostumado, uma rotina de ficar em casa por causa do coronavírus. É um viver novo para todo mundo. E quando eu falei para o Matheus que ele não teria mais atividade do Centro de Formação Paralímpico, ele ficou muito triste. Mas ele mesmo começou a dar voltas em casa, fazia alguns exercícios, para o que ele tinha ganho não sumir da vida dele”, contou Elizabeth.
De volta à ativa
A iniciativa da equipe de atletismo do Centro de Formação do CPB caiu com uma luva, especialmente durante a pandemia de coronavírus. Logo na primeira semana em que retomaram as atividades, 49 alunos participaram das aulas online, com um sorriso de orelha a orelha.
“Tem sido bem legal, porque além de a gente ter contato com os professores e fazer o que gosta, a gente está se movimentando, sem ficar parado em casa, fazendo nada”, comemorou Duda.
“E para nós foi maravilhoso, principalmente porque ela tinha esse tempo ocioso e conseguiu fazer exercício físico, coisa que ela não estava fazendo. Essa retomada foi muito boa, maravilhosa”, complementou a mãe.
E a alegria dessas crianças que faz tudo valer a pena. “A iniciativa dos professores foi maravilhosa. Quando eles entraram em contato e eu falei para o Matheus, na mesma hora ele colocou a camiseta para fazer a atividade. E quando as aulas voltaram na semana passada, a alegria dele em ver os amigos, um chamando pelo outro, foi algo que não tem preço. A gente fica até sem palavras e se emociona”, contou Elizabeth.
“Os professores são muito comprometidos, se importam com os nossos filhos, sabem as necessidades que eles têm. E por isso eles fizeram essa iniciativa de fazer as aulas virtuais. Às vezes as pessoas acham que não funciona, mas funciona sim”, completou.
“Foi um choque. O João já estava acostumado às aulas duas vezes por semana, então essa iniciativa foi muito importante. Ele ficou muito feliz e as aulas têm sido muito enriquecedoras, porque ele pôde voltar a praticar esporte e reencontrar os colegas”, completou Lucineide, a mãe do João.
Torcendo pelo futuro
O Centro de Formação do CPB deve ser suspenso definitivamente na próxima semana, com previsão de retorno apenas no ano que vem. As mães de Duda e Matheus, no entanto, torcem para que a decisão seja revertida de alguma forma, para que, assim, os filhos continuem com as atividades durante a pandemia de coronavírus, mesmo que seja online.
“Eu espero muito mesmo que isso não aconteça. Essa forma virtual que eles estão fazendo é maravilhosa, tanto que a Duda já ensinou outros amigos, primos, formas de se exercitar em casa. Se isso acontecer, nós vamos nos reunir novamente para fazer um abaixo assinado, conversar, e falar com quem quer que seja para manter esse projeto funcionando, porque é um projeto muito bom para as nossas crianças”, pontuou Maria Aparecida.
+Da frustração à missão, a história do Projeto Sem Limites
“Eu fico muito triste, porque o meu filho já tem 17 anos e conforme eles vão crescendo, algumas portas vão se fechando. E se por acaso essa porta do Centro de Formação Paralímpico fechar, eu não sei o que vai ser do Matheus. Não sei como fazer, onde eu vou poder colocar ele. E pessoas com deficiência não podem ficar totalmente em casa, porque elas regridem. Eles precisam estar em constante atividade, convivendo com outras pessoas iguais a eles. Isso faz com que eles amadureçam e cresçam”, completou Elizabeth.
“Vai ser uma tristeza. O esporte é muito importante para as crianças. E que se isso acontecer mesmo, que eles ajudem os profissionais também nesse momento de pandemia e possam readmiti-los no futuro”, finalizou Lucineide.
Entenda o caso
As atividades do Centro de Formação do CPB foram oficialmente suspensas em 16 de março devido à pandemia de coronavírus, mas havia a expectativa de serem retomadas ainda em 2020. Todos os profissionais envolvidos ganharam férias até 30 de abril, mas, antes do fim deste período, foram informados que serão desligados de suas funções.
Ao saber da decisão, pais dos alunos da escolinha começaram um abaixo assinado com a intenção de convencer o CPB a não suspender as atividades. Mas o presidente da entidade, Mizael Conrado, explicou ao OTD na época que a atitude foi tomada para proteger a saúde das crianças em tempos de coronavírus.
Apesar da interrupção dos trabalhos em 2020, Conrado garantiu que o Centro de Formação vai continuar sendo um projeto prioritário do CPB. “Questão econômica é importante, mas o Centro de Formação é prioritário. O orçamento do projeto está garantido. Só vai ser suspenso este ano porque realmente não tem condições de continuar”.