A pandemia de coronavírus chegou de maneira avassaladora, impactando as mais diversas áreas no mundo todo. Entre elas os esportes. Além da suspensão dos calendários esportivos, nacionais e internacionais, e da impossibilidade dos atletas de realizarem seus treinos da melhor forma, os clubes brasileiros estão sofrendo com um impacto financeiro, muitos deles lutando, inclusive para sobreviver. É o que o relata Fernando Cruz, vice-presidente de Formação de Atletas do Comitê Brasileiro de Clubes (CBC).
“O impacto da pandemia de coronavírus varia de região para região. Mas os clubes sociais, de maneira geral, sofreram um impacto muito grande, porque tiveram que ser literalmente fechados. Não tem recurso vindo das competições, os atletas não podem treinar… Isso, além de comprometer a parte esportiva, está comprometendo a própria sobrevivência dos clubes, que não sobrevivem apenas da mensalidade de seus associados”, disse em entrevista ao Olimpíada Todo Dia.
“Então o impacto tem sido muito grande. E clubes de menor porte, sem uma estrutura muito consolidada, terão dificuldade inclusive de sobreviver a essa pandemia. É só a gente ver o que está acontecendo no futebol, que tem mais visibilidade… São entidades com muito mais aporte de recursos e ainda assim, não só no Brasil, mas em todo o mundo, estão tendo dificuldades. A gente teme pela sobrevivência dessas entidades”.
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Auxílio financeiro
Para tentar minimizar os prejuízos causados pela pandemia de coronavírus, o Comitê Brasileiro de Clubes (CBC) antecipou um aporte financeiro de R$ 130 milhões para ajudar os clubes filiados, destinado inicialmente para os próximos ciclos olímpico e paralímpico. O objetivo deste plano de injeção de capital é viabilizar a manutenção e a continuidade do programa de formação de atletas.
“Antes da pandemia, a gente já tinha a ideia de lançar esse edital para dar continuidade ao processo de formação dos atletas, mas não com essa velocidade. Então nós antecipamos o lançamento do edital, que terá a também possibilidade de distribuir os recursos em parcela única”, explicou Fernando. “Pretendemos fazer isso antes do início de 2021, mas tem toda uma tramitação, um processo de análise… Mas esperamos que até o final desse ano os clubes estejam com o recurso em caixa”.
O Comitê Brasileiro de Clubes (CBC) contempla, portanto, nessa medida a continuidade e estabilidade do Programa de Formação de Atletas Olímpicos e Paralímpicos, com flexibilidade na composição técnica e financeira, atualização de valores e a previsão de um Técnico Estratégico Esportivo, além a inclusão da categoria principal.
Sobre este último ponto, Fernando explica: “Até então, só poderiam ser incluídos atletas até a categoria imediatamente anterior à principal. Mas nós entendemos que se o nosso objetivo é a formação de atletas olímpicos, mesmo estando na categoria principal, ele pode não ter o índice para participar das Olimpíadas, mas pode chegar lá. Então, mesmo sendo da categoria principal, ele ainda pode se beneficiar desses recursos”.
O vice-presidente de Formação de Atletas do CBC, no entanto, ressalta que “o objetivo é a formação de atletas olímpicos e paralímpicos. Nós não somos uma entidade assistencial. Então a ideia é colocar o recurso onde ele vai dar resultado”.
De onde vem o capital
A partir de 2011, com a alteração na Lei Pelé, a CBC passou a receber 0,5% das loterias da Caixa Econômica Federal, com o objetivo específico de formar atletas.
Em 2014, houve os primeiros trabalhos de descentralização destes recursos aos clubes. Com a pandemia de coronavírus, o vice-presidente de Formação de Atletas do CBC acredita que poderá haver uma redução na entrada dos recursos, mas garante o próximo ciclo olímpico.
“As pessoas acabam cortando lazer, então cortam os jogos nas loterias, mas ainda não temos o real impacto disso. Sei que houve uma queda, mas não sei falar em números. Mas esse próximo ciclo está garantido. Esses R$ 130 milhões estão garantidos e não dependem da entrada de dinheiro”, explicou Fernando.
Incentivo ao esporte paralímpico
Parte importante da medida de auxílio financeiro do CBC se relaciona ao esporte paralímpico. Os clubes que tiverem categorias ou que investirem em equipes, mesmo que utilizem outro local de treinamento com maiores condições de acessibilidade, ganharão um bônus de 15% sobre os valores que já recebem.
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Impacto no futuro
Notícias de corte de salários, de verbas e até mesmo de pessoas se tornaram cada vez mais comuns. Isso desde as categorias de base até as principais, dos clubes menores aos de elite. E para Fernando, esse momento pode afetar o futuro do esporte brasileiro.
“No Brasil, a formação do atleta é basicamente em clubes, ao contrário, por exemplo, do modelo dos Estados Unidos, em que a formação é feita em escolas e universidades. Se a gente levar em conta que na Rio 2016, 84% dos atletas brasileiros tinha a sua formação feita em clubes, a pandemia pode ter sim um impacto nos clubes a médio, longo prazo”, explicou o vice-presidente de Formação de Atletas do CBC.
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Fernando explicou também que a situação se agrava ainda mais, considerando que antes mesmo do coronavírus, os recursos públicos para o esporte já haviam sido reduzidos.
“Em um momento pré-pandemia, a sinalização do governo já era de corte de recursos… o próprio ministério do esporte foi substituído por uma secretaria, os recursos para incentivo do esporte foram reduzidos. Assim, a fonte de recursos dos clubes já era o CBC. Agora, agregado isso ao impacto da pandemia de coronavírus, nós passamos a ter essa grande responsabilidade de manter a continuidade da formação de atletas no Brasil”.
Sobre o CBC – Formando cidadãos
O Comitê Brasileiro de Clubes foi criado em 1990, ainda com o nome de Confederação Brasileira de Clubes. Em 1998, entidade passou a fazer parte do Sistema Nacional de Desporto, se equiparando aos Comitês Olímpicos e Paralímpicos do Brasil.
Com nome de Comitê Brasileiro de Clubes desde 2017, o CBC lança editais, os clubes apresentam projetos, que são analisados e o CBC destina o recurso em três eixos: equipamento e material; campeonatos brasileiros interclubes (com custeio de viagem e hospedagem); e equipes técnicas.
“A missão do CBC é formar atletas olímpicos e paralímpicos por intermédio dos clubes. Mas a formação de atletas que o CBC estimula, é muito maior do que a simples prática esportiva. Nós temos a pretensão de formar muitos campeões, mas para cada campeão formado, temos milhares de crianças sendo iniciadas no esporte. E o esporte vai ter uma influência na vida toda dessas crianças. A criança que se habitua à prática esportiva desde cedo vai ser um adolescente, um adulto com hábitos de vida mais saudáveis. Então muito mais do que formar campeões, nós formamos cidadãos íntegros e saudáveis. E felizmente, alguns viram campeões”, concluiu Fernando Cruz.