8 5
Siga o OTD

Jogos Sul-Americanos

Gabrielle Roncatto: Determinada, versátil e incansável

Abelardo Mendes Jr/rededoesporte.gov.br

Com quatro ouros e uma prata nas cinco provas que disputou nos Jogos Sul-Americanos, Gabrielle Roncatto é um dos principais destaques do megaevento continental em Cochabamba

A infância e a adolescência de Gabrielle Roncatto foram dominadas por braçadas, pernadas e repetições. Muitas repetições. Um cotidiano bem diferente de grande parte das amigas, que inclui alimentação regrada, rotina controlada, treinos intensos e, em geral, extensos. Se para alguns tem jeito de privação, para ela é investimento.

Um investimento que tem recompensa ao fim de cada prova, principalmente quando ela bate na borda na frente das adversárias. “É nesses segundos que você percebe que todo o esforço vale a pena”, diz. Aos 19 anos, a paulista colecionou na Bolívia, nos últimos dias, uma lista dessas sensações. Foi intensamente protagonista do Time Brasil nos Jogos Sul-Americanos de 2018. E se destacou em meio a um elenco brilhante: os 20 integrantes da equipe junior de natação somaram, antes do último dia de competições, 25 medalhas, 14 delas de ouro.

O Centro Aquático de Cochabamba será lembrado com carinho por Roncatto por muito tempo. Ela disputou cinco provas. Ganhou quatro e ficou em segundo na quinta. Os ouros vieram nos 200m livre, 200m medley, 400m medley e no revezamento 4 x 200m livre, além do segundo lugar nos 400m livre. “Esses Jogos serão um divisor de águas. Quando a gente sobe no lugar mais alto do pódio, escuta o hino e vê a bandeira do Brasil subindo, temos a certeza da realização de um sonho que a gente alimenta desde criança”, afirma.

Gabrielle tem como mantra reunir determinação, versatilidade e empolgação. Gosta de entrar na piscina, seja para qual prova for. Já competiu em provas de borboleta, costas e peito. Hoje, está na fase do crawl e do medley. Nos últimos anos, até se aventurou nas provas de longas distâncias em águas abertas, de 5 e 7,5km.

“Eu gosto de nadar tudo, desde pequena sempre foi assim. Isso acabou me ajudando, para ter um leque bom para escolher. Para Tóquio 2020, a gente tem de focar em uma ou duas. Não dá para nadar todas. Temos de encontrar a prova certa e treinar. Gosto bastante dos 200m livre e dos 200m medley”, afirmou.

Precoce, Gabrielle foi a caçula da delegação de natação nos Jogos Rio 2016, aos 17 anos. Foi uma das integrantes do revezamento 4 x 200m livre. Antes do megaevento, contudo, ela viveu uma adversidade inesperada e desafiadora. Poucos dias antes da seletiva, estava tomando banho em casa quando o vidro do boxe “explodiu”. Ela desmaiou e só acordou com o cachorro lambendo seu rosto. Sozinha em casa, percebeu que tinha cortes profundos na coxa e nos braços. Era sábado. As provas classificatórias para os Jogos durante o Troféu Maria Lenk seriam dias depois.

“Liguei para o meu técnico, Márcio Latuf, chorando. Me levaram para o hospital e o médico queria dar ponto em tudo. Afirmou que haveria cicatrizes horríveis se não desse ponto. Falei que não iria dar ponto algum, porque iria para a seletiva. Eu fiquei cheia de cortes. Isso me marcou muito”, recordou.

Determinada, superou a dor física em prol do sonho. Entrou na piscina e garantiu a vaga. “Como não deu tempo para cicatrizar, os ferimentos doíam na piscina. Faltavam uns quatro meses para os Jogos. O meu técnico teve que ter muita paciência, porque fiquei brava demais com tudo aquilo”, contou.

Em Cochabamba, a atleta, que é beneficiária do Bolsa Atleta, do Ministério do Esporte, e faz parte do programa de alto rendimento das Forças Armadas, concedeu entrevista ao rededoesporte.gov.br e também participou de um Facebook Live na Vila dos Atletas. Confira a conversa em vídeo e a entrevista.

Recordista brasileira júnior

Na prova de peito no tradicional Troféu Chico Piscina conquistei quatro títulos seguidos. Ninguém conseguiu isso até hoje. Entretanto, na minha geração já enfrentei muitas atletas fortes, como nadadoras olímpicas e medalhistas pan-americanas, como a Jhennifer Conceição, especialista em nado peito. Felizmente consegui manter o meu rendimento.

Especializar x diversificar

Deixei de competir no peito quando percebi que as minhas marcas não estavam evoluindo. Por outro lado, comecei a crescer no crawl e no medley. Ainda treino peito, até porque ele, junto com o crawl, são as minhas principais parciais no medley. Eu gosto de nadar tudo. Desde pequena sempre foi assim. Já nadei borboleta, costas e depois peito, crawl e, agora, o medley. Isso acabou me ajudando a ter um leque bom para escolher as provas. Gosto bastante dos 200m livre e dos 200m medley. Para 2020, vou focar em uma ou duas provas.

De carne e osso

Foi uma experiência única competir nos Jogos Rio 2016. Eu estava bem nervosa. Eu me coloquei bastante pressão, por ser a mais nova da delegação. Estava com expectativa alta. Todos os brasileiros deram o melhor. Acho que qualquer vitória ou derrota serve como lição. Aprendi muito com os mais velhos, evoluí vendo outros atletas de perto, como a Katinka Hosszú e o Michael Phelps. Não é normal para nós brasileiros ver esses astros de perto. Tivemos poucos grandes nomes mundiais, como Cesar Cielo e Gustavo Borges. Eu vejo eles como heróis. A experiência foi boa para ver que todos esses grandes nomes são de carne e osso. A vivência me garantiu confiança, pois tive a certeza de que eu posso também conseguir. É só se dedicar e treinar com foco que tudo é possível.

Talentosa geração

Essa geração que está aqui é diferenciada. Eu consigo imaginar muitos deles atletas nadando nas Olimpíadas de 2020 e de 2024. A própria Rafa (Rafaela Raurich), que nadou comigo os 200m livre, é uma menina nova com muita maturidade para competir e treinar, tem um cuidado grande com a alimentação, observa o descanso e tem tudo para chegar em 2020 e 2024 e representar muito bem o Brasil.

Viciada em treinar

Cheguei em Cochabamba na quinta-feira e o meu técnico repetiu umas 40 vezes que nos primeiros três dias não era para fazer treino forte, era só para soltar. Eu não aguentei. Quis treinar forte. Eu sempre gostei bastante de treinar, sempre fui competitiva. Desde pequena não queria perder nem para os meninos. Já treinei com pessoas experientes, como a Joanna Maranhão, que dá “pau” nos meninos nos treinos. São meninas competitivas que me ensinaram bastante. Levo um pouco do ensinamento de cada uma. Participei de uma equipe muito forte no Pinheiros, com Guilherme Guido. Tento dar 110% para poder chegar aqui, bater na borda e ficar feliz.

Fator Cochabamba

Nadei com atletas muito experientes, acostumados a nadar em altitude. Estou bem satisfeita com as cinco medalhas, apesar das dificuldades. Consegui o meu 100% para representar bem o Brasil. No fim, Cochabamba foi muito importante. Foi a minha primeira competição em altitude. Será um divisor de águas por isso e, principalmente, porque quando a gente sobe no lugar mais alto do pódio, escuta o hino e vê a bandeira do Brasil subindo, isso te dá a certeza de estar realizando um sonho de criança.

Mundial Militar

Quando eu voltar vou treinar bastante porque vou competir o Mundial Militar, na Rússia. No ano que vem vou competir nos Jogos Mundiais Militares, que são muito importantes. Neste ano ainda temos o Troféu Finkel, o Sul-Americano da modalidade e o Open de Natação.

Mais em Jogos Sul-Americanos