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Judô

Diretor judoca ajuda a transformar lixão em polo do Instituto Reação

Professor de educação física, Keitel Jorge Moreira Júnior conheceu o judô já depois de formado, virou faixa preta e agora dirige escola que abriga o primeiro polo do Instituto Reação fora do Rio

Keitel Júnior diretor da Emeb Professor Firmo José Rodrigues em Cuiabá
Keitel de olho no treino da garotada (Marcello Zambrana)

O primeiro polo do Instituto Reação fora do Rio de Janeiro fica em uma escola municipal de Cuiabá, a Emeb Professor Firmo José Rodrigues, no bairro de Três Barras. Foi erguido muito pela colaboração do diretor da escola, judoca faixa preta que ajudou a transformar o local onde ficava um lixão em um dojô que atende 270 crianças de baixa renda.

Na véspera da inauguração do polo, é Keitel Jorge Moreira Júnior quem recebe na Emeb os jornalistas que vão acompanhar a abertura oficial do dojô. O diretor seria protagonista do evento ao lado do ex-atleta Flávio Canto, idealizador do projeto, e David Moura, apadrinhado que vai capitanear o polo cuiabano do instituto.

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Keitel é professor de educação física e está no começo do terceiro mandato de três anos como diretor, todos adquiridos via eleição direta realizada nas comunidades escolar e do bairro. “Eu vim aqui para ficar seis meses, substituir um amigo. E desses seis meses já estou com 19 anos aqui dentro”, conta. Além de diretor e professor de educação física, Keitel é judoca. Faixa preta, quarto dan.

Keitel Júnior diretor da Emeb Professor Firmo José Rodrigues em Cuiabá
Keitel foi eleito três vezes diretor pela comunidade (Marcello Zambrana)

“Eu já comecei veterano. Fui trabalhar em 98 como professor de educação física da (escola da) mãe do David e lá eu comecei o judô, com o Sensei Hatiro Ogawa e o Sensei Fenelon (pai de David). Depois disso eu consegui ser aprovado em um concurso público do município e por onde eu andei, levei o judô. Em todas as escolas que eu passei, que são várias, eu sempre coloquei o judô”.

Do lixão à fábrica de gigantes

Flávio Canto repetiu bastante durante a inauguração que o Instituto Reação estava abrindo uma fábrica de gigantes em Cuiabá, “formando faixas pretas dentro e fora dos tatame”. Curioso é que o local onde o polo foi erguido na escola não era nada que parecesse isso antes da chegada de Keitel. “Era um lixão. Tudo é visão. Eu vi que ali poderia ser feito alguma coisa. A primeira que eu pensei, pelo espaço, foi passar um trator, fazer uma estrutura de areia, com duas traves, cercar e ‘vai ficar um campo legal’. E ficou, ficou um campo muito bonito.”

Logo o campo prosperou e se formou um time bom de bola, que desafiava garotos do bairro valendo picolés. Só para os “times visitantes”, se ganhassem. Tudo pelo bolso do diretor. “Mas aí, devido ao calor, nós tivemos de migrar para a quadra e eu achei muito pouco só o futsal. Eu tinha de oferecer uma modalidade para aquele menino que não gosta de futebol, mas que tivesse uma outra habilidade que ele pudesse desenvolver”. Foi aí que a proximidade do professor de educação física com o judô entrou.

“Pedi para a diretora, ela comprou doze placas de tatame e nunca parei. Só fui aumentando o número de placas. Daí quando o David veio com o Sensei Flávio, ele apresentou a ideia do Instituto Reação. Imagina se eu adorei, né?”, lembra, com um sorriso no rosto.

Faltava uma sala em Cuiabá. Com alguma dificuldade de arrumar pelo poder público, resolveram eles levantar o dojô. “Ele (Flávio Canto) disse assim para mim: ‘eu posso construir aqui?’ Aí que eu entrei na história como diretor, com o conselho e a secretaria municipal de educação. O projeto foi feito e encaminhado ao prefeito. Na hora ele aceitou a ideia”. Keitel acrescenta: “quem bancou foi o banco BV, a primeira que se manifestou. A secretaria municipal de educação e a própria prefeitura. Foi uma parceria excepcional”.

“Eu quero ver eles bem”

O judô já estava na escola antes do Reação, com o Sensei Keitel. “Eu tinha um time bom aqui, um time forte, mas aí por falta de investimento a gente diminui. Eu dava aula duas vezes na semana, depois passei para somente aos sábados. Mas a chama sempre esteve acesa”. Sempre pensando em como ajudar os alunos. “Eu quero ver eles bem, bem arrumadinho, bem vestidinho”.

Alunos no Instituto Reação em Cuiabá
Polo cuiabano atenderá inicialmente cerca de 270 crianças (Marcello Zambrana)

Não apenas isso. “Eu espero fazer um cidadão. Um cidadão do bem. Uma pessoa honesta, que possa falar, um dia, eu estudei nessa escola e é uma boa escola”, emociona-se. “Eu nunca passei necessidade na vida. Nunca. Então você chega em uma escola dessa que a criança pede para comer?”, fala, novamente com um nó na garganta. “Agora ela tem um esporte de ponta, de qualidade, que ela pode sonhar. Eu ofereço aos meus alunos o sonho”.

“O meu sonho é ver essas crianças bem, ver meus alunos que hoje eu encontro na rua e hoje são profissionais. Eu não quero ver mais aluno morto, não. Já perdi muito. Me dói ir a um velório de um aluno. Hoje eu não vou mais, porque a escola cresceu. Hoje eu consegui implantar um sistema de vida diferente. E nisso entrou o judô, entraram os professores, entrou a secretaria que investe. Enquanto eu estiver por aqui e puder ajudar essa criançada, eu vou ajudar”, diz, pouco antes do sinal do recreio tocar e começar a correria pela Emeb de Cuiabá.

Jornalista com mais de 20 anos de profissão, mais da metade deles na área de esportes. Está no OTD desde 2019 e, por ele, já cobriu 'in loco' os Jogos Olímpicos e Paralímpicos de Tóquio, os Olímpicos de Paris, além dos Jogos Pan-Americanos de Lima e de Santiago

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