Dia de finais nos Jogos Escolares da Juventude de Blumenau, em Santa Catarina. As atenções estão voltadas para os tatames do wrestling. No canto, perto da área de treinamento, o baiano Erick dos Santos Julião é puro desânimo. Cabeça baixa, arrancando o uniforme de forma ríspida, com o único pensamento de abandonar a luta olímpica.
“Isso não é para mim”. Prontamente, Guilherme Porto, que se preparava para sua próxima luta, entra na frente e rebate. “Para com isso, olha o seu tamanho, pode ter sido seu último JEJ, mas você ainda tem muitas chances”.
Ainda desanimado e desconfiado, Julião responde. “Tenho 15 anos ainda, posso vir outras vezes, mas sei lá…”. Guilherme toma um susto, faz uma cara de espanto e não acredita no que seus olhos veem.
“15 anos, não pode ser. Você está de brincadeira. Olha o seu tamanho. Você tem totais condições. Eu com 15 anos pesava 47kg. Olha o seu tamanho!”. Pela primeira vez, o rosto de Julião muda de feição. O sorriso largo, ainda tímido, aparece.
Guilherme Porto, muito mais desenvolto, experiente e cascudo, segue falando e olhando firme para Julião. “Eu lutei com você hoje, mas não sabia da sua idade. Vi que você tinha tamanho, mas poucos golpes e parecia um pouco perdido no combate. Depois da pausa, se você voltasse mais tranquilo, olha, a luta poderia ter ido por outro caminho.”
Julião já não tem mais o olhar distante. A mistura de elogio e crítica do adversário lhe traz confiança, mesmo que momentânea. “É, eu vim do judô, ainda tenho algumas manias. Fico procurando o quimono para ter a pegada.”
“Sim, deu para perceber mesmo. Faz parte. Muitos aqui começam no judô. Eu também comecei com quatro anos. Mas o que você precisa aprender são dois golpes para a luta em pé e mais dois para a luta no chão. Assim você já vai melhorar muito. Olha o seu tamanho”, repete Guilherme.
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O encontro vira uma conversa. O respeito mútuo foi alcançado rapidamente, com sinceridade e empatia. Julião mostra um sorriso largo. Antes do papo continuar, Guilherme mostra algumas técnicas, dá dicas e incentiva o mais novo.
“Você não pode parar. Faça rifa, venda pizza, coisa que eu já fiz, e siga competindo. Você tem muito potencial.” Já com os braços descruzados, Julião comenta que faz isso também, mas que a família prefere que ele vá fazer outra coisa.
Assim como quando luta, Guilherme parte para o ataque. “Cara, eles fazem isso porque gostam de você. É natural. Mas na luta você nunca perde, sempre ganha experiência.”
Julião concorda com a cabeça. “Eu acho que posso tentar. Gosto de lutar”. Sempre no ataque, Guilherme parte para cima. “A Bahia tem um histórico vencedor no judô. Mas no wrestling, você precisa treinar no Rio ou em São Paulo, de vez em quando. Eu precisei sair do Mato Grosso também. Você vai treinar comigo, junto com a seleção. A Confederação Brasileira de Wrestling promove esses encontros, tem lá no site deles, eu te ajudo.”
Os dois seguem trocando ideias, como se se conhecessem há tempos. A interação provoca arrepios em ambos. Julião escancara os dentes, ri alto. Os dois se abraçam.
No fim do dia, Guilherme Porto está no alto do pódio dos Jogos Escolares da Juventude. Medalha de ouro. Julião terminou sua participação individual em sétimo lugar. A história desses dois seguirá. Aguardem os próximos capítulos.