Ainda faltam 1.280 dias para a abertura da Olimpíada de Tóquio-2020. Mas aqui no Brasil uma modalidade já está em pleno clima dos Jogos. Nos últimos dias, postagens em redes sociais colocaram em evidência um dos esportes que irá estrear na Olimpíada japonesa, o skate. Está em curso uma verdadeira “guerra das rodinhas” para definir quem será a entidade responsável por organizar o esporte no Brasil.
De um lado, a CBHP (Confederação Brasileira de Hóquei e Patinação), que foi reconhecida, por meio de carta oficial (ver abaixo) do COB (Comitê Olímpico do Brasil) como interlocutor oficial para a preparação no próximo ciclo olímpico. Do outro lado, a CBSk (Confederação Brasileira de Skate), que teve seu reconhecimento negado pelo COB e que conta com apoio de mais de sete mil integrantes da comunidade do skate no Brasil para que ela seja a representante oficial da modalidade para Tóquio-2020.
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A questão é complexa. Do ponto de vista legal, a CBHP tem razão quando aponta estar vinculada de forma oficial não apenas ao COB como também à única entidade internacional reconhecida pelo COI (Comitê Olímpico Internacional) que responderá pelo skate olímpico. A FIRS (Federação Internacional de Esportes sobre Rodas, significado da sigla em português) é integrante da SportAccord, organização que reúne todas as federações esportivas internacionais para esportes olímpicos e não olímpicos.
Em compensação, a CBSk, que existe desde março de 1999, vem trabalhando todos estes anos pelo desenvolvimento da modalidade no Brasil e diz que a CBHP nunca fez nada pelo skate. Seus representantes afirmam também que estão vinculados à ISF (Federação Internacional de Skate), que estaria trabalhando junto ao COI na gestão da organização do skate olímpico nos Jogos de 2020.
Para tentar sensibilizar o COB e conseguir o seu reconhecimento, a CBSk criou um abaixo-assinado virtual no site change.org, o #somostodosCBSK, que tem mais de 7,5 mil assinaturas até hoje (20/1).
Para tentar esclarecer o caso, o blog ouviu os dois lados envolvidos nesta complicada questão que pode atrapalhar a preparação de um dos potenciais esportes ganhadores de medalha do Brasil em Tóquio-2020. E sem entrar no mérito de quem tem razão, fica apenas uma certeza: os grandes prejudicados em tudo isso são os atletas.
“O skate nunca fez nada para ser olímpico”
Moacyr Neuenschwander Junior, presidente da CBHP
Laguna Olímpico – Quando começou a polêmica envolvendo a responsabilidade da organização e supervisão das competições de skate no Brasil?
Moacyr Neuenschwander Junior – A polêmica foi gerada por pessoas que desconhecem ou querem desconhecer as hierarquias institucionais às quais estão comprometidos os Comités Olímpicos nacionais de todos os países, em respeitar a Carta Olímpica inclusive no que tange as filiações das Federações internacionais reconhecidas pelo COI (ARISF), gestoras de suas modalidades.
No caso específico, a única Federação Internacional dos esportes sobre rodas reconhecida pelo COI é a FIRS que, por sua vez, tem a CBHP como sua única filiada no Brasil – desde os anos de 1950. A CBHP, portanto, é a única entidade gestora dos esportes sobre rodas perante a FIRS e por consequência ao COB/COI.
Exemplos concretos são as participações de nossas Delegações através do COB nos Jogos de Barcelona de 1992 e em todos os demais Jogos dos ciclos olímpicos das Américas desde que os esportes sobre rodas entraram nos Jogos Cruz del Sur (atualmente Jogos Sul-Americanos da ODESUR) em 1978 e nos Jogos Pan-Americanos da ODEPA desde 1979.
Desde quando a CBHP supervisiona e organiza as competições de skate no Brasil?
Após a definição de sua inclusão nos próximos Jogos de Tóquio-2020, a CBHP, como representante legal da modalidade perante a FIRS/COB/COI, fará o necessário planejamento estratégico junto ao COB para o próximo ciclo olímpico no sentido de obter o maior dos êxitos nos Jogos de Tóquio, à exemplo do que sempre fizemos durante todos os demais ciclos já anteriormente mencionados desde 1978.
Como vocês encararam a criação de uma confederação própria para o skate? O que você acha que motivou a criação desta entidade?
De acordo aos próprios praticantes, o Skate é um modo de vida. Há diversos outros exemplos similares em modalidades diversas até que, um dia, elas são chamadas à formalidade dos esportes olímpicos. É fato amplamente divulgado que o olimpismo nunca foi o objetivo primário dos praticantes do Skate. Se assim não fosse, porque as existentes entidades internacionais que clamam por reger esta modalidade (WSF e ISF) nunca pleitearam seu reconhecimento junto ao COI nem à SportAccord?
Lamentamos que os praticantes da modalidade agora se manifestem sem ter conhecimento da estrutura formal do esporte em todos os níveis e de que cabe à FIRS o protagonismo de ter tornado o skate num esporte olímpico, fato infelizmente ocultado ou menosprezado por algumas entidades que não se interessaram em acompanhar o longo processo que é a inclusão de uma modalidade nas olimpíadas e agora, os compromissos daí decorrentes. É importante que o público saiba disto.
Quais as ações que a CBHP fez para o desenvolvimento do skate nos últimos anos, antes mesmo da modalidade ter sido aprovada para a Olimpíada de Tóquio-2020?
Esta não é questão a ser discutida pois a modalidade nunca fez parte dos ciclos olímpicos até então. Os eventos realizados até então foram na verdade grandes Opens. A CBHP realiza eventos formais, através de entidades filiadas e legalmente reconhecidas dentro das Leis que regem o esporte formal brasileiro.
Acredita que o pano de fundo desta polêmica é apenas o financeiro, ou seja, a possibilidade de poder receber as verbas da Lei Agnelo/Piva?
Não estou em condições de julgar a índole das pessoas que hoje, de repente, apareceram no cenário querendo buscar um protagonismo por um objetivo logrado por outras entidades, e pelo qual poderiam, se fosse de seu real interesse, haver lutado desde muito antes.
Há alguma possibilidade do COB aceitar a CBSk como a entidade responsável pelo skate olímpico?
Não. O Comitê Olímpico do Brasil é uma entidade centenária, zelosa da Carta Olímpica e dos direitos constituídos pelas instituições às quais ele se reporta e aquelas que são suas filiadas.
Entende que realmente o skate pode estar integrado junto às demais modalidades esportivas da CBHP?
Não tenho nenhuma dúvida sobre isto e já estamos trabalhando muito seriamente neste sentido.
Existe alguma possibilidade de acordo entre a CBHP e a CBSk para acabar com esta crise?
Eu iria propor de fazer uma parceria com eles após ter uma reunião com o COB. Mas eles tomaram um caminho errado, quiseram ir pela força. Se esta parceria vier a ser feita, será pelas nossas condições. Não fui eu quem comprei esta briga.
Acredita que poderá existir boicote da comunidade do skate do Brasil para a Olimpíada de 2020?
A comunidade do skate do Brasil é muito grande. Duvido que um atleta vá deixar de perder a oportunidade de ir para uma Olimpíada. Para Tóquio, haverá uma fila de atletas querendo representar o Brasil.
“Nossa preocupação é a administração do skate nacional sair das mãos dos skatistas”
Edson Scander, vice-presidente da CBSk
Laguna Olímpico – Qual foi o principal motivo para a criação da campanha #somostodosCBSK?
Edson Scander – Divulgar para a sociedade, imprensa e poderes públicos o que está acontecendo com o skate brasileiro e quem os skatistas brasileiros, principalmente as grandes estrelas, apoiam.
Quando foi fundada a CBSK e o que motivou a criação desta entidade?
A CBSk foi cria de um processo iniciado em 1987 com a criação da União dos Skatistas e Empresários (USE) que em 1988 tornou União Brasileira de Skate (UBS). Ela foi fundada em 06 de Março de 1999 pro entidades gaúchas, paranaenses, paulistas, baianas e brasilienses, motivadas pelo sonho de organizar o Skate brasileiro.
A CBHP já realizou ações para o desenvolvimento do skate do Brasil? Eles organizam competições, regulamentam o esporte etc?
Sugiro pesquisar no site e redes sociais da entidade para tomar suas próprias conclusões.
Quando vocês tiveram a informação de que o COB não iria reconhecer a existência da CBSK?
Há algumas semanas.
Chegaram a conversar com a CBHP para algum tipo de acordo que pudesse permitir o reconhecimento da CBSK?
Não. (Nota do blog: em entrevista ao site Tribo Skate, do portal Ativo, Scander disse que houve apenas um contato com a CBHP, há um ano, quando souberam que a entidade estava organizando campeonatos de street, uma das modalidades que estarão em Tóquio-2020, ao lado do skate park. De acordo com Scander, foi Moacyr Neuenschwander Junior quem respondeu a mensagem, dizendo que também eram administradores do skate no Brasil e não precisavam dar satisfação pra CBSk).
Existe alguma entidade internacional que esteja apoiando a iniciativa da separação do skate da CBHP com a criação de uma entidade própria?
Desde 2005 existe a International Skateboarding Federation (ISF) formada pelas principais entidades de Skate e skatistas do Mundo, sendo seu vice-presidente o maior skatista de todos os tempos, Tony Hawk. Esta entidade que trata com o COI da participação do Skate nas Olimpíadas há 12 anos e quem lidera a Tokio Skateboarding Comission (TSC), órgão criado pelo COI para gerir o processo olímpico do skate mundial. A CBSk é fundadora, portanto filiada, na qual os últimos presidentes da CBSk foram vice-presidentes da ISF.
Caso o COB realmente não reconheça a filiação da CBSK, a comunidade brasileira do skate cogitaria boicotar a participação nos Jogos Olímpicos de Tóquio?
Isto não foi discutido, temos muito tempo até 2020.
A questão desta polêmica com o skate olímpico tem como pano de fundo a questão da verba que a entidade responsável receberá da Lei Agnelo/Piva?
A preocupação principal é administração do Skate nacional sair das mãos dos skatistas e perdermos oportunidades de desenvolvermos o nosso esporte/estilo de vida conforme várias gerações construíram. A CBSk não participando do processo olímpico, não sendo filiada ao COB, ela e suas filiadas perderão a representatividade para cobrar das autoridades ações efetivas junto aos poderes públicos para melhorias para o esporte que praticamos. Também a CBSk será questionada sobre sua legalidade pelas grandes empresas brasileiras estatais ou privadas nas negociações sobre patrocínios dos projetos da entidade, como já está acontecendo e colocam em risco um planejamento para quatro anos de prepararmos adequadamente nossos skatistas para as Olimpíadas, como aproveitar a chance de ouro de impulsionarmos o desenvolvimento do skate como nunca aconteceu no país.
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