No dia 22 de dezembro de 2013, quase 20 mil pessoas lotaram a Kombank Arena, em Belgrado, para o duelo entre Sérvia e Brasil pela final do Campeonato Mundial de handebol feminino. Com a forte tradição do handebol europeu, as anfitriãs chegaram na decisão do título como favoritas. Mas o Brasil venceu a partida por 22 a 20 para se tornar a primeira equipe das Américas campeã mundial da modalidade.
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O título mundial foi a coroação de um trabalho de longo prazo. Desde o início do século, o Brasil vinha evoluindo no handebol feminino, construindo uma hegemonia continental e melhorando os seus resultados em Campeonatos Mundiais e Jogos Olímpicos. Antes de 2013, a seleção feminina mostrou um grande crescimento no ciclo anterior, ficando entre as oito primeiras colocadas no Mundial de 2011, disputado em São Paulo, e na Olimpíada de Londres, em 2012.
“Acredito que foi um processo de adquirir mais confiança. Sempre chegávamos muito perto muito perto e não ganhávamos. No mundial tudo pareceu se encaixar. Aprendemos profundamente a confiar uma nas outras , e manter a força mental durante os momentos difíceis de jogo”, afirma Duda Amorim, MVP do Mundial de 2013.
A campanha
O Brasil fez uma ótima fase de grupos, vencendo todas as suas cinco partidas. Nas primeiras rodadas, vitórias tranquilas sobre Argélia (36 a 20) e China (34 a 21). Na terceira rodada, um primeiro duelo contra a Sérvia, com as brasileiras ganhando por 25 a 23. Para fechar a primeira fase, mais duas vitórias contra Japão (24 a 20) e Dinamarca (23 a 18). O mata-mata começou com um 29 a 23 sobre a Holanda, que então colocou o Brasil nas temidas quartas de final.
“Já tinha virado uma pressão extra não passar essa etapa em outros campeonatos. E esse jogo foi pra tempo extra, realmente uma superação e uma vitória que representou nosso Mundial” – Duda Amorim
A seleção brasileira vinha com pressionada por não passar da fase em grandes competições. No Mundial de 2011, uma derrota por apenas um gol para a Espanha. No ano seguinte, derrota para a Noruega nas quartas, após ir para o intervalo vencendo a partida. Em 2013, o Brasil travou uma batalha épica contra a Hungria. As equipes empataram em 26-26 no tempo regulamentar. Após duas prorrogações, o Brasil venceu por 33 a 31 e finalmente avançou para a semifinal do Mundial de Handebol, onde venceu a Dinamarca por 27 a 21.
A grande final
O duelo entre Brasil e Sérvia na final foi bastante acirrado. Durante o primeiro tempo, a Sérvia chegou a liderar o placar por 8 a 6. Mas após uma sequência de quatro gols, as brasileiras voltaram a liderar a partida até o final. Nos último minutos, a Sérvia conseguiu empatar a partida em 20 a 20 e teve a chance de empatar de novo em 21-21. Mas após um erro da equipe europeia, Ana Paula Rodrigues marcou o gol que garantiu a maior vitória da história da seleção brasileira de handebol feminino.
“O jogo que elas fizeram foi espetacular. Fica difícil dizer. Nunca houve um jogo de handebol como esse, 20 mil pessoas jogando contra, e elas ignoraram isso. Colocaram um compromisso na cabeça e jogaram para isso. Meu Deus, o Brasil, um país das Américas, campeão do mundo de handebol? Isso é difícil de acreditar”, avaliou na época o técnico Morten Soubak em entrevista ao GE.
Batalha na arquibancada
Em meio aos quase 20 mil torcedores no ginásio na final, haviam 11 torcendo para o Brasil. Os Chapolins Brasileiros acompanham o esporte olímpico brasileiro desde os Jogos Pan-Americanos de Guadalajara, em 2011, onde desenvolveram uma relação especial com a seleção feminina de handebol, com o grupo passando a acompanhar mais de perto a equipe. Em 2013, eles foram até a Sérvia para acompanhar o Campeonato Mundial. “Éramos os únicos torcedores brasileiros que estavam no ginásio. E foi indescritível. Muita emoção, porque foi uma conquista construída jogo a jogo. Foi a maior emoção que eu já vivi acompanhando o esporte. Mais do que ver as seleções de vôlei serem campeãs olímpicas ou ver a seleção de basquete vencer o mundial”, comentou Rubens Tófolo, um dos fundadores dos Chapolins Brasileiros e que estava na final em Belgrado.
O grupo pequeno ficou em festa após o jogo, mas também com medo da torcida organizada da Sérvia. “A final foi uma das coisas mais inusitadas que já vi no esporte. Parecia uma batalha campal, uma coisa meio medieval. Quando a gente chegou na final, já encontramos uns caras da torcida organizada deles que diziam que iam pegar a gente na saída. O Djokovic aparecia no telão inflamando o público. A torcida era bem inóspita. Tinha gol da Sérvia e eles esfregavam a bandeira na nossa cara. Nosso guia mandava a gente não revidar e na hora de gol do Brasil era para a gente gritar só para as jogadoras, mas sem olhar para eles.”
Hora de Celebrar
Depois do jogo, o grupo teve que esperar o ginásio ser esvaziado para poder voltar para casa. Eles tiveram que tirar a fantasia de Chapolim e foram escoltados pela polícia local. Mas deu tudo certo e o grupo conseguiu festejar o título com as jogadoras. O ritmo da festa: “Celebrar” da banda de axé Jammil e Uma Noites. A música foi escolhida pelas atletas como a trilha sonora daquele mundial, embalando a conquista brasileira.
E na naquele domingo, elas celebraram como se o mundo fosse acabar, em uma noite que colocou o handebol do Brasil em outro patamar. “Esse título deixou como legado uma inspiração de que é possível. Então mesmo não tendo tradição no handebol, se trabalhamos por anos e anos com foco podemos conquistar algo expressivo para o nosso país”, lembrou Duda Amorim.