A parceria entre Júlio César Macena, o Cesinha, e Fábio Vasconcelos começou há um bom tempo, longe do desporto paralímpico, no futebol de salão. Passados alguns anos, Cesinha, ou Júlio César Macena, vai substituir o companheiro como técnico da seleção brasileira de futebol de cegos. A missão é árdua, já que o Brasil foi campeão de cinco das seis edições dos Jogos Paralímpicos e, como se fosse pouco, jamais perdeu uma partida no maior palco mundial do esporte adaptado. Apesar disso, manter o país no topo não é o maior desafio, de acordo com Cesinha.
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“O maior desafio é substituir o cara que revolucionou a modalidade. Antigamente era muito individual. Cada um pegava um jogador, como o Ricardo, o Jefinho. Eles pegavam a bola e saíam driblando três, quatro. Era individualidade. O Fábio trouxe algumas movimentações adaptando do futsal (futebol de salão) e deu certo. Hoje o mundo copia o Brasil, o mundo joga o futebol de cegos se espelhando um pouco no futsal”, diz Cesinha. “Foi a coragem do Fábio, de enxergar que o cego é capaz de fazer. Muita gente que não convive no meio dos cegos, acha que eles são incapazes. Mas vivemos o dia a dia, sabemos que se se dedicar, mostrar, eles vão conseguir fazer”, acrescenta.
Júlio César Macena também entende que está assumindo a melhor seleção de todos os tempos, “o espelho para as outras equipes”, e enxerga na parte física o vetor de evolução dos rivais. “O nível físico está muito alto. Isso igualou muito. Hoje você vê uma Argentina marcando em losango. Às vezes muda a formação marcando no Y. São formações do futsal que o pessoal está trazendo para o futebol de cegos”, diz. “As equipes vêm se profissionalizando a cada dia mais. Então a cada dia mais, as equipes são mais preparadas.”
Origem no Futsal
Cesinha e Fábio Vasconcelos se conheceram pelo futsal. O primeiro ainda como jogador e o segundo, já como treinador. “A carreira seguiu, cada um foi para o seu lado. Parei de jogar cedo e revi Fábio três anos atrás, no final de 2021. Ele me fez o convite pra aprender a treinar os cegos. A primeira resposta que dei foi ‘não’, porque não imaginava treinar os cegos. Ele disse que me ensinaria e fui conhecer. Chegando lá, logo que vi, disse: ‘isso dá pra mim'”. Ele acrescenta que, como Fábio Vasconcelos já havia levado conceitos do futsal para o futebol de cegos, não demorou a pegar o jeito.”Não fugia muito daquilo que eu vivenciei durante toda a minha vida. Sentamos, conversamos e em dois meses, observando ele dar treinos, assumi a Apace.”
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Apace é a Associação Paraibana de Cegos, sediada em João Pessoa, na Paraíba. Na primeira competição que disputou como técnico, em 2021, foi campeão. “Isso nos motivou a querer algo mais, a se dedicar mais e vislumbrar coisas maiores” Uma dessas “coisas maiores” era a seleção. “Lógico que era muito cedo, mas desde lá já me via procurando esse espaço”. Em 2022, a Apace conquistou o título brasileiro de futebol de cegos, encerrando um jejum de 16 anos, e o nome de Cesinha ganhou força. “Começaram a olhar pra mim de outra forma”. Logo em seguida, ele foi chamado para ser técnico auxiliar da seleção de base “com o professor Baía, o professor Neide. Onde aprendi muito e sou muito grato aos dois.”
Sub-23
Um ano depois, Cesinha assumiu a seleção sub-23, já trabalhando bem perto de Fábio Vasconcelos. “E continuava na Apace. Sempre na seleção de base e na Apace. Tivemos duas competições nesse sub-23 e nas duas obtivemos êxito. O Parapan de jovens, na Colômbia, em Bogotá, fui campeão em cima da Argentina. E um Grand Prix, onde a gente levou a seleção sub-23 pra jogar contra as seleções adultas e fomos campeões tirando o Japão, um time muito forte, adulto, que estava na Paralimpíada. Além de um time sub-23 na semifinal e sendo campeão em cima da Inglaterra.”
Chamador em Paris
A trajetória foi ganhando força, sempre muito próxima da seleção adulta, já que ambas costumam treinar juntas. E veio o convite para integrar como chamador a delegação que iria para os Jogos Paralímpicos de Paris. O chamador fica atrás do gol adversário conduzindo em voz alta as ações ofensivas de uma equipe de futebol de cegos. “A seleção veio para João Pessoa, onde resido. Infelizmente, o Juninho, que era o chamador, não pôde vir devido a trabalho. O resto da comissão veio toda. E foi feito esse convite para mim. Nem hesitei. Até brinquei: ‘para a Paralimpíada vou até como roupeiro.’ Fizemos um grande trabalho. Eu aprendi muito como chamador. Não foge muito, né? Não foge muito do lado técnico. O chamador é um técnico da área ofensiva e isso facilitou muito.”
A campanha do Brasil em Paris foi a única na história dos Jogos Paralímpicos em que a seleção não foi campeã. Perdeu a semifinal para a Argentina nos pênaltis e levou o bronze derrotando a Colômbia. “Quando perde, fica procurando alguma coisa para justificar. Principalmente nas primeiras horas. O porquê aquilo aconteceu, porque aquela bola não entrou. Mas depois você para pra analisar direitinho. A Argentina evoluiu, fez um jogo de igual para igual com o Brasil. Poderia ter vencido. O Brasil também poderia ter vencido. É um nível muito alto. Então, é detalhe”, diz o novo técnico da seleção.
Zero derrotas
Apesar de o ouro não vir, a invencibilidade da seleção na história do futebol de cegos em Jogos Paralímpicos permaneceu intocada. “Futebol de cegos está cada diz mais difícil, mas vamos nos preparar bem para continuar invicto. Se der tudo certo, em Los Angeles vamos conseguir nosso êxito, que é a medalha de ouro e que seja invicta também, continuar sem perder”, fala Cesinha, que vê pontos positivos no crescimento dos adversários. “É bom para a modalidade. Bom para todo mundo. Pra TV que quer jogos difíceis, porque se pegar um jogo onde ganha de oito a zero, só o Brasil joga. Mas aquilo não é um produto que vai ser bem atrativo para ser comprado. Então, com essa evolução do futebol de cegos, está ganhando todo mundo.”