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Adiamento de Tóquio muda planos de maternidade de atletas

Laís Nunes e Fabi contam os planos para o futuro após os adiamentos e se espelham na experiência de colegas como Tandara e Brait

Maternidade no esporte - Fabi - Laís Nunes - Suellen - Tandara - Camila Brait
Laís Nunes e Fabi adiaram a maternidade após a remarcação de Tóquio 2020 (Olimpíada Todo Dia)

Ser mãe é o sonho de muitas mulheres. Mas quando se trata de maternidade e esporte, não é algo tão simples assim. Gravidez mexe com o corpo e o corpo é o instrumento principal de um atleta. É comum, portanto, ver atletas mulheres planejando a gravidez de acordo com seu momento profissional, seja para engravidar depois de se aposentar, seja para encontrar o momento propício para ter filho e voltar a competir.

Planos, porém, nem sempre saem como o esperado. Foi que aconteceu com o adiamento das Olimpíadas de Tóquio 2020 por causa da pandemia de coronavírus.

O período pós-olímpico é um dos preferidos das atletas que planejam a gravidez. É o que explica a ginecologista do Comitê Olímpico Brasileiro (COB), Tathiana Parmigiano.

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“O primeiro anos após as Olimpíadas é muito mais tranquilo. Então a maternidade vem sem cobrança… Isso é algo que a gente preconiza, porque queremos que elas curtam o momento, sem a necessidade de um retorno às competições precoce ou abrupto de certa forma, tanto para elas curtirem a fase, quanto para prevenir lesões”, afirmou Tathiana.

“Dá tempo de engravidar, de amamentar, de fazer um retorno gradual ao esporte e com uma adaptação do corpo que acabou de passar por uma mudança hormonal importante”, completou a ginecologista do COB.

Por isso, muitas atletas tinham em mente disputar as Olimpíadas de Tóquio e iniciar o processo da maternidade logo depois. Com a remarcação dos Jogos, porém, os planos mudaram e foram adiados, pelo menos, em um ano. É o caso de Fabi Claudino, do vôlei, e de Laís Nunes, do wrestling.

Fabi - Fabizona - Fabi Claudino - Tóquio
Fabi e Vinícius se casaram em 2018 (Instagram/fabiclaudino)

Sonho de menina

“Sempre tive o sonho de ser mãe, desde nova. Um dos meus maiores sonhos era casar e depois ter filho. Esse adiamento mudou muita coisa. Eu sempre digo que um ano na vida de um atleta é muita coisa. Fiquei chateada, mas obviamente entendo o momento que a gente está passando e foi a melhor decisão”, relatou Fabi, a Fabizona, como é chamada, ao Olimpíada Toda Dia. 

Fabi, porém, já tem 35 anos, uma idade mais avançada quando o assunto é gravidez. “No momento em que você adia as Olimpíadas, você adia em um ano a expectativa pessoal delas. E quando a gente fala de mulher, a idade é sempre uma vilã, de certa forma, tanto para a performance esportiva, quanto para a maternidade. Então isso acabou trazendo uma preocupação para algumas atletas sobre o que fazer”, explicou a Dra. Tathiana.  

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A numerologia dos filhos das nossas atletas vai mudar… 😉 O adiamento dos Jogos mexeu nos planos familiares dessas mulheres. Algumas estão postergando não apenas o sonho olímpico, mas também o da maternidade. 🤰 . Muitas atletas já tinham decidido, desde o início deste ciclo olímpico, que começariam as tentativas para engravidar tão logo voltassem de Tóquio este ano – algumas brincavam que já começariam lá mesmo ☺️ . O que fazer agora? Como conciliar dois planos que são tão importantes para a vida e que estão tão intimamente ligados entre si e também ao calendário e ao relógio biológico? Uma angústia que não pode ser minimizada. . Há ainda um outro grupo que não tinha planos de engravidar no momento e já tinham decidido congelar óvulos para fertilizar. Muitas delas, inclusive, porque queria encarar depois o novo ciclo para Paris-2024. O procedimento estava no radar delas pós-Tóquio. Com a mudança na data, estão adiantando os planos e já iniciando as consultas para congelar desde já. . Situação super importante para a preservação da fertilidade ao se considerar a idade. Para esse nível de atleta também existe a preocupação com os medicamentos que serão usados. Muitos são doping! Mesmo usados por pouco tempo e para uma razão tão específica – esse cuidado é essencial. O atleta é responsabilizado por tudo aquilo que consome. Mas a maioria dos médicos não sabe checar essas substâncias! . Enfim… Umas congelam sonhos e outras óvulos. E outras já estão produzindo bebês “quarenteners” desde já! Tem fotinho de teste de gravidez já bombando no meu celular! 😂 . Ciclos da vida, com suas previsibilidades e imprevisibilidades… 🤷🏻‍♀️ cada um escrevendo sua história! . E a numerologia? Ela se ajeita 😉 #atletasolimpicas #gestação #maternidadeadiada #toquio2020 #toquio2021 #paris2024 #congelamentoovulos #congelamentodeovulos

Uma publicação compartilhada por Tathiana Parmigiano (@ginecologiadoesporte) em

A volta de Fabi às quadras após a maternidade é uma incógnita até para ela mesma. Mas uma coisa é fato, Paris 2024 não está nos planos.

“A mulher, quando chega uma certa idade, já começa a se cobrar, além de que pode virar uma gravidez de risco. Mas assim, nós somos mulheres e não tem muito como escapar disso. Chega uma hora que seus sonhos, seus objetivos começam a mudar um pouco de foco. Depois que eu tiver filho, não sei como vai ser. Tem que rezar para que seja tudo normal e depois a gente vê se volta a jogar. Mas já está difícil pensar em Tóquio, em Paris então… não consigo nem imaginar.”

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Laís Nunes, por sua vez, viveu algo parecido com Fabi, precisando adiar um pouco os planos de ser mãe. “Eu sempre quis ter filhos, amo muito crianças. E o meu objetivo era engravidar em 2020, depois das Olimpíadas, em um período que não tenha muitas competições, que dê para eu me preparar, cuidar do meu filho. Como os Jogos foram adiados para o ano que vem, acabei adiando esse planejamento também”, contou Laís ao OTD.

O caso de Laís, no entanto, é diferente do de Fabi. Ela tem 27 anos e o tempo ainda está a seu favor.

“Vou para Tóquio em 2021 em busca de uma medalha olímpica, mas depois disso, continuo mantendo o plano de ter filhos e de não parar de competir. Então eu pretendo sim ter filho e voltar para Paris 2024. Não penso em esquecer esse sonho só por causa do esporte. Não é algo que vai me impedir e eu acho que dá para conciliar os dois e, principalmente, ser feliz.” 

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Laís e a afilhada, Anna Clara (Instagram/laiswrestling)

Para além da idade

A maternidade no esporte, e fora dele também, no entanto, envolve questões além da idade. Como a própria Laís destacou, a ideia é engravidar em um momento que ela também possa se dedicar ao filho da melhor maneira possível. E, apesar de não ter sido afetada diretamente pelo adiamento de Tóquio, quem concorda com ela é a lateral-esquerdo do Corinthians, Suellen.

“Quase sempre, nós do esporte vivemos 100% para isso, e acabamos esquecendo de que a vida no esporte é curta. Com o tempo, vemos amigos nossos formando família e a gente que, quase a vida toda, viveu para isso, se depara com um limite para o término da profissão e o início de uma construção familiar. E existe o medo de não estar bem estruturada para o momento, além também voltar tarde demais à profissão”. 

“Tenho amigas no futebol que tiveram filhos e seguem normalmente com a profissão. Mas no meu caso, com quase 30 é melhor ‘tentar’ se programar para um momento melhor”, completou.

O momento certo para gravidez, no entanto, depende de cada mulher e de cada família. “Para não gerar um conflito pessoal, da mesma maneira que ela planeja a vida esportiva, ela pode planejar a maternidade. Então eu sempre torço para que seja em um momento que ela possa viver isso por inteiro, plenamente, feliz. Ela tem de poder ser mãe”, destaca a ginecologista. 

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Suellen, lateral-esquerdo do Corinthians (Rodrigo Coca)

Suellen e a Dra. Tathiana, porém, destacam um fator externo: a questão financeira. Além de planejar a maternidade levando em conta a idade e o momento da carreira, é importante considerar as economias. 

“Acredito que poucos clubes no Brasil possuam um bom plano de saúde, que cubra tudo e dê um respaldo profissional e financeiro para esse momento, infelizmente”, aponta Suellen, que enfatiza não ser esse o caso do Corinthians. “Temos um plano que cobre toda a parte médica para a ocasião e a organização como profissional no momento em que se torna gestante”. 

“A prioridade é que elas possam curtir esse momento, sem preocupações externas, como o contrato com os clubes. A lei trabalhista brasileira em relação às atletas, não as protege. Então essa programação financeira também é importante de ser feita”, completa a Dra. Tathiana.

Exemplos e inspirações

Certamente, Fabi, Laís Nunes e Suellen não estão sozinhas nessa. Elas não são as únicas que passaram e passam por esse momento de (in)definição quanto à maternidade no esporte, e casos de atletas que passaram pela gravidez e voltaram às competições não faltam. É o caso das companheiras de Fabi no vôlei, Camila Brait e Tandara.

Apesar de as histórias e contextos serem diferentes de Fabi, Laís e Suellen, e de Brait e Tandara não terem planejado a gravidez, ambas provam que é sim possível conciliar maternidade e esporte e retornar às quadras em alto nível após ser mãe. E servem de inspiração para outras atletas.

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“Eu sempre tive o sonho de ser mãe, mas quando decidi engravidar, já havia decidido não vestir mais a camisa da seleção. Então, não estava em ciclo olímpico. Mas engravidei em 2017, antes da final da Superliga. Eu planejava engravidar depois, mas aconteceu”, contou Camila Brait. 

Planejamento físico especial

A líbero, hoje com 30 anos, chegou, inclusive, a jogar a final da Superliga grávida. Ela contou com todo o apoio do clube e cuidado médico, mas a Dra. Tathiana adverte que isso não pode ser regra quando o assunto é maternidade e esporte. 

“Durante a gravidez, a prática esportiva é incentivada, mas não a competição. A gente não visa performance durante a gestação. São exceções as atletas que competem grávidas e isso não pode ser tido como regra. Manter uma rotina esportiva é ok, mas sem metas a serem alcançadas”, explica. 

Após o nascimento de Alice, Brait conta que Marcelo Vitorino, preparador físico do Osasco, fez um planejamento para que ela pudesse retomar a forma e entrar em quadra o mais rápido possível. 

“Uma insegurança (sobre voltar após a gestação) sempre bate, mas amo jogar vôlei. E Osasco me deu todo apoio e estrutura. Acho que voltei mais forte depois do nascimento da minha filha, que é tudo para mim. Decidi aceitar novas convocações em 2019, quando a Alice já tinha dois anos”, destacou Brait. Ela inclusive planeja, pelo menos, mais um filho e não descarta ter o terceiro. 

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A fã nº1 da mamãe Camila Brait (Instagram/cbrait)

Vencendo os próprios medos

O mesmo aconteceu com a campeã olímpica Tandara, quando estava no Praia Clube, na temporada 2014/2015. “Eu não decidi ser mãe. A Maria Clara foi o maior e o melhor susto da minha vida”. 

“Meu maior desafio foi vencer os meus medos. Porque eu tinha o medo de não conseguir voltar… Será que eu vou conseguir ser capaz de voltar e cuidar da Maria Clara? Em nenhum momento eu duvidei de que poderia, mas existe esse receio. Querendo ou não, tudo aqui dentro de mim mudou. O meu corpo mudou completamente”. 

Apesar dos medos e receios, Tandara se comprometeu consigo mesma e até a José Roberto Guimarães, treinador da seleção brasileira de vôlei feminino, que se cuidaria e voltaria após a gravidez o mais rápido possível. E foi o que aconteceu. Deu a luz à Maria Clara no dia 13 de setembro e em 21 de outubro, já estava de volta à Superliga. E menos de um ano depois, quase foi às Olimpíadas do Rio, mas acabou cortada, junto com Camila Brait, na última lista antes dos Jogos.

Neste momento, porém, entra outra adversidade: como deixar a filha? “É muito difícil (ficar longe). Meu primeiro momento com ela foi muito intenso, fui muito mãe nos primeiros quatro meses, e depois eu tive que abdicar disso. Logo tive o Grand Prix pela seleção, que é o campeonato mais longo, fique 42 dias longe dela”, explicou.

“Foi difícil, porque eu perdi algumas coisas do crescimento, das descobertas dela. Eu chorei muito e foi uma das coisas mais dolorosas da vida”, relembrou Tandara, emocionada. 

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Torcida especial de Maria Clara à mamãe Tandara (Instagram/TandaraCaixeta)

Fato é que todas “sobreviveram” à gravidez e têm na maternidade uma fonte de inspiração e força. Tanto Camila Brait, como Tandara voltaram a jogar em alto nível e sonham até em participar de Tóquio 2020. O que o futuro reserva à Fabi, Laís Nunes e Suellen, porém, ninguém sabe. Seja ele qual for e em que momento for. A única certeza é de que maternidade e esporte não são e não podem ser inimigos. Pelo contrário, são aliados muito forte. 

“Ser mãe é a coisa mais maravilhosa do mundo. Foi a melhor coisa que me aconteceu. E garanto que, como todas as mulheres profissionais, as atletas também conseguem conciliar o esporte e a maternidade”, concluiu Camila Brait.

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