A Nike, sempre ela, fez o que todos os puritanos e conservadores temiam: inventou um tênis que faz os atletas voarem, dizem. Não, não é um tênis com asas, que decola, faz rasante e tudo mais. O que estão falando por aí é que os tênis melhoram os tempos dos maratonistas. Os terraplanistas da corrida estão chamando de doping tecnológico.
O que as pessoas não param para pensar é que não são super-tênis que correm sozinhos. Todo trabalho duro ainda fica por conta do atleta que dá cada passada, que dita o ritmo, que sente falta de ar e dor da intensidade durante os 42,195 km. Temos que lembrar que estamos falando de atletas fora de série. Por mais que os calçados garantem um conforto e que possam ajudar, o atleta tem que correr rápido e treinar forte.
Todo esporte tem regras, claro. O atletismo conta com o artigo 143.2 que fala sobre a universalidade dos calçados. A regra diz que o calçado não pode oferecer vantagem. Mas se seguir a letra fria da lei, qualquer tênis garante vantagem de uma forma ou de outra, se não os maratonistas teriam que correr descalços.
Eu acredito que o tênis não é igual um carro de fórmula 1 em que o piloto não faz tanta diferença quanto um bom mecânico e a potência do motor. Claro que piloto bom faz diferença, mas um motor potente e o acerto na aerodinâmica conquistam títulos. Nem o melhor piloto de toda história seria capaz de vencer dirigindo um fusquinha.
Tênis também não é igual ao cavalo que faz todo o serviço no hipismo. Sem dúvida o cavalo é que deveria ser reconhecido como atleta, pois o cavaleiro poderia se passar claramente como técnico. Ele, sentadão, fica só orientando o atleta a pular e a virar.
Antes dos Jogos Olímpicos de Tóquio, a Nike apresentou uma série de calçados que usam elementos da tecnologia projetada para o maratonista campeão olímpico Eliud Kipchoge (Quênia) – considerado o maior maratonista de todos os tempos.
Em outubro de 2019, Kipchoge participou do evento INEOS da Nike de Viena, na Áustria, e se tornou o primeiro homem da história a percorrer os 42,195km abaixo de duas horas, com o tempo de 1:59:40. Claro que foi em um evento completamente controlado para bater o recorde, tanto que não foi reconhecido oficialmente pela organização do atletismo. Mas o que pegou mesmo foram os calçados utilizados, um protótipo chamado Nike Air Zoom Alphafly NEXT%.
Os questionamentos ficaram por conta de uma fibra de carbono inserida entre a sola que pode ajudar na fase de impulsão da corrida. Os tênis incluem também dois “airbags” – que dizem que reduzir a quantidade de energia perdida pelos movimentos de um atleta. Tanto que os calçados utilizados por Kipchoge durante o recorde foram banidos em competições oficiais com base nas regras do esporte. No contra-ataque, a Nike redesenhou os pares e anunciou o tênis Alphafly Next% totalmente adequado às novas regras.
O tamanho 8.5 tem 39.5 mm de altura e o tênis tem apenas uma placa de fibra de carbono. O novo modelo estará disponível para venda para os membros do site da Nike no próximo dia 29 e fevereiro.
Claro que a graça do esporte não é ver o adversário perder, mas a igualdade de disputa. Estamos no caminho sem volta em que veremos uma série de recordes nacionais e mundiais sendo batidos nos próximos anos por conta da combinação entre melhores maratonistas de todos os tempos e os tênis que faz voar, para o desespero dos terraplanistas das maratonas.