No último domingo estava conversando com o meu pai, na varanda de casa, quando o papo furado caiu no campeonato carioca. Vira e mexe, quando falamos sobre futebol, chegamos no Botafogo. Ele é um legítimo botafoguense que acredita que a fé é a certeza daquilo que espera e a prova das coisas que não vê. Convivendo com o meu pai, aprendi que não tem como falar do glorioso sem falar de fé.
Papo vai e papo vem, ele foi contando várias histórias nostálgicas do clube carioca. “O Botafogo e o Santos são os times que mais cederam jogadores para a Seleção Brasileira. O futebol tem muito a agradecer aos dois clubes”, ele gosta de repetir, orgulhoso. Prefiro acreditar que é a ponta de esperança que o mantém torcendo pelo time.
Quando voltei para casa, porém, o assunto não saiu da minha cabeça. Foi aí que percebi que o Botafogo deixou de ser um clube de futebol para se tornar um patrimônio cultural e imaterial brasileiro. O IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) bem que poderia cuidar para que não morresse o modo peculiar dos botafoguenses de torcer e a arte dos cartolas de manter o time longe de títulos.
Curioso, fui ao site do IPHAN para entender melhor a função do órgão. Ele foi criado em 1937 e é responsável pela preservação e divulgação do patrimônio material e imaterial do país. O site informa que a função da entidade é “defender e favorecer os bens culturais do país proporcionando sua existência e usufruto para as gerações presentes e futuras, buscando a preservação dos tesouros da cultura nacional”. Olha aí, é tudo de que o esporte brasileiro precisa.
Durante o exato momento em que assistimos às provas ou partidas, o esporte não passa de entretenimento. No minuto seguinte, o lazer e o passatempo viram história, que é incorporada simultaneamente à cultura nacional. No final, tudo vira matéria-prima para abastecer os museus do país.
Isso me fez lembrar de Guilherme Paraense, que abriu caminho à bala para os campeões olímpicos tupiniquins. Em 1920, nos Jogos da Antuérpia, na Bélgica, os primeiros a contar com atletas brasileiros, Guilherme Paraense conquistou a primeira medalha olímpica de ouro para o Brasil. A façanha veio na prova de pistola de tiro rápido 25m.
Depois da façanha de Paraense, foram precisos 32 anos até que Adhemar Ferreira da Silva, no salto triplo, fizesse o país brilhar nos Jogos Olímpicos de Helsinque 1952. Com Adhemar, o Brasil voltaria ao lugar mais alto do pódio quatro anos depois, na mesma prova, na edição dos Jogos de Melbourne 1956.
Outra história de que o IPHAN pode cuidar aconteceu em 1992, em Barcelona. Do lado de fora da quadra, o técnico da Seleção Brasileira masculina de vôlei, José Roberto Guimarães, comandou a caminhada inesquecível da equipe que conquistou o primeiro ouro olímpico em esportes coletivos do país.
O grupo de Barcelona foi formado por Maurício, Talmo, Marcelo Negrão, Janelson, Jorge Edson, Tande, Giovane, Paulão, Pampa, Douglas Chiarotti, Amauri e o capitão Carlão e Zé Roberto. O final da gloriosa campanha na Espanha terminou com uma cena que milhões de brasileiros jamais esqueceram: um saque pancada indefensável de Marcelo Negrão no fundo de quadra. Assim, a Seleção Brasileira venceu a Holanda por 3 sets a 0, com parciais de 15/12, 15/8 e 15/5.
Vejo mais drama, ação, suspense e, porque não, romance dentro do esporte do que em muitos filmes e livros ruins por aí. Prefiro uma boa partida de futebol do que o escuro da sala de cinema. Já assisti mais apresentações de ginástica artística do que espetáculos de dança ou balé.
Vivemos em uma época estranha, em que as pessoas são cada vez mais egocêntricas. Só querem consumir, cobrar e não pensam em investir e incentivar. Como os brasileiros não conseguem olhar para o esporte como algo importante e que colabora para a evolução da sociedade, mesmo depois de acolher o mundo durante os Jogos Olímpicos e Paralímpicos de 2016 e a Copa do Mundo de futebol 2014, a gente tem que mudar de postura e passar a tratar o esporte como patrimônio cultural do país. Quem sabe assim iremos valorizar mais o esporte.