Teve um tempo em que o uniforme do Brasil nos Jogos Olímpicos poderia ter sido branco, com faixa preta na diagonal e a cruzmaltina do Vasco no peito. Era na virada do milênio e o único Bug que teve naquele ano foi da delegação brasileira nos Jogos Olímpicos de Sydney 2000, na Austrália.
Eu tinha 14 anos. Lembro bem, porque foi na época em que os meus pais colocaram uma tv por assinatura lá em casa pela primeira vez. Antes de instalarem um ponto da TVA na sala de casa, a minha única opção esportiva que tinha era o Globo Esporte, na hora do almoço, e o Esporte Espetacular, nas manhãs de domingo. Aquele aparelhinho preto abriu um universo de possibilidades. Na época, a internet ainda era de conexão discada e acessada por meio do provedor gratuito do IG, só a partir da meia noite, claro, porque era mais barato. Acordava cedo, ia para a escola, voltava para casa, assistia a Turma do Chaves e depois passava o dia vendo os canais esportivos. Quando chegou o mês de setembro fiquei maluco. Nem às 14 horas de fuso (Austrália-Brasil) me impediram de ver tudo sobre os Jogos Olímpicos.
Em Sydney, a maior parte da delegação brasileira era formada por atletas do Vasco da Gama. Até ali, nunca o Brasil tinha chegado tão favorito aos Jogos e nunca saiu tão vice da competição. Foi uma chuva de prata e nenhum ouro na bagagem de volta. O país conquistou seis segundos lugares e seis bronzes. Foi a única campanha sem ouro desde Montreal, em 1976, e terminamos na modesta 56ª posição no quadro de medalhas, a pior colocação do país em toda a história. Nem nos Jogos de Barcelona, em 1992, quando subimos só três vezes ao pódio, tivemos um desempenho tão ruim, pois das três medalhas duas foram de ouro.
A história do copo meio cheio e meio vazio resume bem o significado da medalha de prata, ou do vice-campeonato. Existem dois tipos de segundos lugares: o dos perdedores e os dos ganhadores. Basta olhar as fotos e comparar os rostos dos atletas de esportes coletivos e individuais nas cerimônias de premiação. No vôlei ou no futebol, vemos os olhares tristes ao receberem um verdadeiro prêmio de consolação pela perda do ouro. Já em outros esportes, como natação e atletismo, o sorriso é de orelha a orelha, com a prata brilhando no peito, com aquele sabor de conquista.
As histórias do Vasco nos Jogos Olímpicos foram ressuscitadas na semana passada com a morte do ex-cartola Eurico Miranda, a mente por trás da versão olímpica do trem bala da colina. Foram dois anos de projeto, 1999 e 2000.
O jornalista Márvio dos Anjos relembrou, no Twitter, uma história curiosa pré-jogos sobre o falecido dirigente. Era 1999 e o primeiro grande teste do time foi a disputa dos Jogos Pan-Americanos de Winnipeg, no Canadá. Eurico andava para cima e para baixo, pelas instalações esportivas e pela vila dos atletas, com uma pasta debaixo dos braços cheia de papéis com os resultados dos atletas vascaínos. O nome da pasta era PAÍS VASCO. Bem ao estilo Eurico de ser. Vale lembrar que na época não existia internet da forma que temos hoje, muito menos smartphones para acompanhar os resultados.
O País Vasco era uma potência, pelo menos na teoria. Entre as estrelas, os velejadores Robert Scheidt e Torben Grael, a duplas de vôlei de praia, Adriana Behar e Shelda, o cavaleiro Rodrigo Pessoa. Na natação, o principal nome do país, o medalhista olímpico Gustavo Borges, fez parte da turma de São Januário. No atletismo tinha o quarteto que levou o vice-campeonato no revezamento 4x100m, com André Domingos, Claudinei Quirino, Edson Ribeiro e Vicente Lenílson.
Na olimpíada de Sydney, o clube contou com 83 atletas, sendo que 19 deles voltaram com medalhas (contando os atletas de esportes coletivos). Nunca o Brasil tinha chegado nos Jogos com tantos atletas favoritos como em Sydney. Por outro lado, nunca colecionou tantos fracassos em medalhas dadas como certas. Com o País Vasco em ação, corremos sérios riscos de sermos rebaixados para a série B dos Jogos Olímpicos.