Fiquei sabendo pelo Twitter. Não demorou para que a informação circulasse em grupos de WhatsApp. Em seguida, os principais portais noticiaram. O Brasil entrou, definitivamente, no mapa do tênis de mesa internacional. O carioca Hugo Calderano, 22 anos, apareceu na sexta colocação do ranking mundial. Para os olhos leigos, a posição pode não significar muita coisa. Porém, é a primeira vez que um jogador que nasceu no continente americano (Norte, Sul e Central) alcança a marca.
Encontrei pela primeira vez com o Hugo Calderano em 2014. Estava na China acompanhando os Jogos Olímpicos da Juventude de Nanquim. Ele tinha 18 anos e fiquei admirado com o seu porte físico, reflexo e maturidade. Três anos antes, já tinha impressionado ao vencer, por 3 a 2, o Hugo Hoyama, então melhor jogador nacional, durante a seletiva do Campeonato Latino-Americano. Na China, ele conquistou a medalha olímpica de bronze.
No Brasil, ser atleta de qualquer outro esporte sem ser o futebol é o mesmo do que desejar ser escritor em um país de analfabetos. Sei que pode parecer exagero, mas a dificuldade, falta de visibilidade e interesse das pessoas torna difícil a vida dos atletas olímpicos, mesmo para aqueles profissionais bens sucedidos.
Calderano é para o tênis de mesa brasileiro como Neymar é para o futebol nacional, Isaquias é para a canoagem e Robert Scheidt é para a vela. Um fenômeno com a bolinha e a raquete nas mãos. Antes do sexto lugar de Calderano, o melhor brasileiro no ranking foi o Ubiraci da Costa, Biriba, que alcançou 19º lugar, em 1961.
Fiquei imaginando como o gosto da vitória tem vários sabores e, muitas vezes, a medalha é um detalhe. Para um brasileiro, sexto lugar pode ser um grande resultado. Já para outro atleta, a mesma posição pode significar um grande fracasso. O que está em jogo é a quebra de barreiras.
Para entender o feito do brasileiro, basta olhar os cinco primeiros da lista. Ele está atrás somente de três chineses, um alemão e um japonês. Os chineses Fan Zhendong e Xu Xin são o primeiro e o segundo colocados, respectivamente. Em seguida, o alemão Boll Timo e o japonês Harimoto Tomokazu.
O tênis de mesa é um esporte extremamente popular no oriente, mas sem expressão no Brasil. Lá, mesa-tenistas são populares como jogadores de futebol por aqui. Desde que a modalidade ingressou no programa oficial dos Jogos Olímpicos, em Seul-1988, a China impõe uma hegemonia. São 53 medalhas, das quais 28 de ouro em 32 possíveis. Para se ter uma ideia, no feminino jamais uma mulher do país deixou de ser a primeira colocada.
Certa vez, um amigo me falou que todo sucesso do dia para noite acontece depois de dez anos de trabalho duro. Em 2009, o carioca ocupava a 1.295 do ranking mundial. Ele vem num gráfico ascendente no cenário internacional desde 2013, ano em que deixou pela primeira vez sua marca, com o título do Aberto do Brasil, evento com chancela da federação internacional (ITTF). Na ocasião, era o 260º do mundo, tinha 17 anos e superou nas semifinais e finais dois dos então titulares da seleção: Cazuo Matsumoto e Gustavo Tsuboi.
Nos Jogos Olímpicos disputados no Brasil, o mesa-tenista chegou como 54º do mundo. Fez quatro partidas memoráveis na chave individual. Venceu dois atletas melhores ranqueados que ele (o sueco Par Gerell, então 32º do ranking, e Tang Peng, de Hong Kong, que era o 15º). Transformou o Pavilhão 3 do Riocentro em sucursal de estádio de futebol. Experimentou uma interação com a torcida até então inédita para a modalidade. No fim, chegou às oitavas de final e só foi eliminado após uma partida equilibrada contra o japonês Jun Mizutani, sexto do mundo à época, e que terminaria o torneio com a medalha de bronze.
Hugo Calderano está construindo uma carreira esportiva parecida com a do tenista Gustavo Kuerten, que levou o Brasil ao topo do mundo em um esporte sem tradição de resultados. Claro, será muito difícil bater os chineses, mas Calderano está chegando cada vez mais perto.