“A situação em torno da equipe russa de atletismo é triste. Mas quero fazer um pedido: não reduzam todos os atletas ao mesmo nível. É injusto privar os atletas inocentes, que não têm envolvimento no caso, do direito de participar dos Jogos do Rio.”
O apelo, até um tanto desesperado, foi feito pela bicampeã olímpica e recordista mundial do salto com vara Elena Isinbayeva, nesta sexta-feira, após conhecer a decisão da Iaaf (Associação das Federações Internacionais de Atletismo), que suspendeu provisoriamente a Rússia de todas as competições da modalidade. Na prática, a decisão tira os atletas russos do atletismo da disputa dos Jogos Olímpicos do Rio 2016, incluindo no mesmo balaio até mesmo a estrela Isinbayeva.
A decisão tomada pelo conselho da Iaaf quase que por unanimidade (22 votos contra um) fechou uma semana de caos para o atletismo e também para o esporte olímpico. Na última segunda-feira (9), uma comissão independente da Wada (Agência Mundial Antidoping), comandada pelo ex-presidente da entidade, Richard Pound, divulgou um explosivo relatório de mais de 300 páginas, denunciando que as autoridades russas que comandam o controle de doping do país manipularam amostras, cobraram propinas de atletas para esconder resultados positivos e ainda destruíram 1.417 exames no final do ano passado, antes de uma vistoria da Wada.
O mais assustador é que o ministro do Esporte russo, Vitaly Mutko, teria participação direta em pedidos de manipulações, além de agentes da FSB (que sucedeu a antiga KGB) teriam trabalhado infiltrados no controle antidoping durante os Jogos de Inverno de Sochi, em 2014.
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Para completar, o relatório apontou que duas medalhistas nas Olimpíadas de Londres 2012 – Mariya Savinova e Ekaterina Poistogova, respectivamente ouro e bronze nos 800 m –teriam resultados positivos encobertos, com anuência, vejam só, do antigo presidente da Iaaf, o senegalês Lamine Diak, que inclusive está sendo investigado pela polícia da França por suspeita de ter recebido US$ 1 milhão em propina para encobrir as maracutaias russas.
Uma semana para o esporte esquecer, cá entre nós.
Por isso, a decisão da Iaaf em suspender provisoriamente a Rússia de todas as competições internacionais, convenhamos, é até leve. “A mensagem não poderia ser mais forte. Trata-se de um alerta, mas que valerá até que a Rússia realize as mudanças necessárias”, disse Sebastian Coe, atual mandatário da Iaaf. O COI (Comitê Olímpico Internacional), logo que o relatório da Wada foi divulgado, anunciou que tomaria medidas drásticas baseado em sua política de tolerância zero se confirmadas as infrações das normas antidoping em eventos olímpicos.
Há muitos anos desconfia-se da atuação de atletas russos, não apenas no atletismo. Ao divulgar o relatório, Richard Pound disse que era a ponta de um iceberg e que pode encobrir casos em outras modalidades, o que teria uma proporção desastrosa para o esporte mundial. Não é à toa que a Rússia lidera os casos positivos de doping desde 2013, segundo levantamento da própria Wada: foram 225 testes positivos neste período, ou 11,5% do total. Bem à frente da Turquia, quer teve 188 casos nos últimos dois anos (9,6% do total).
O comitê olímpico russo anunciou neste sábado que irá liderar uma reforma profunda na federação de atletismo do país, com o objetivo de mostrar à Iaaf e ao COI que a suspensão merece ser revogada. Duro é acreditar que um país que se presta a deixar agentes do serviço secreto para fraudar resultados de testes de doping possa ter qualquer ação oficial levada a sério. Todo castigo é pouco para a Rússia e seus dopados.