No post anterior comecei a contar a história de He Zhili, campeã no Mundial em 1987 apesar da ordem para entregar o jogo para a compatriota Guan Jianhua na semifinal. É que os seus técnicos achavam que Jianhua tinha melhor chance de vencer na decisão a sul-coreana Yang Young-ja – que eliminara a chinesa Dai Lili na outra semi. E pela desobediência, ou seja: He Zhili não entregou o jogo – ela acabou ficando de fora de Seul-1988, estreia do tênis de mesa no programa olímpico.
Motivos para a China ter deixado de fora sua melhor mesatenista
O site de tênis de mesa Arghk.com lembra que desafiar a autoridade tinha um preço na China nos anos 1980. Sun Meiying, mentora de He Zhili, estava entre os poucos que defenderam a mesatenista. Isto é, ela fez o que podia para convencer os dirigentes que sua pupila merecia um lugar na equipe. Sun Meiying chegou a publicar um artigo com dados científicos, dizendo que Zhili era, sem dúvidas, a melhor mesatenista chinesa de sua geração. Ou seja: não só ela era a campeã mundial, como ainda estava no auge (He Zhili tinha 23 anos na época). Tais argumentos tiveram pouco efeito e Zhili perderia sua chance de lutar pelo ouro olímpico.
Nos anos seguintes, Zhili sumiu do mundo do tênis de mesa competitivo. Ela foi substituída, punida. A China optou por deixá-la de fora. Mas Zhili teria nova chance de voltar às arenas internacionais. Ela se casou com o japonês Koyama Hideyuki, e em 1994 tornou-se Koyama Chire. Quando retomou a raquete, estava com o uniforme da seleção japonesa.
He Zhili voltou ao palco internacional como Chire Koyama e foi novamente campeã
Nos Jogos Asiáticos de 1994, realizados em Hiroshima no Japão, Chire (Zhili) enfrentaria as melhores mesatenistas chinesas da geração seguinte à sua: Qiao Hong, Chen Jing e Deng Yaping.
A rivalidade no tênis de mesa entre China e Japão era intensa. Mas o nível do tênis de mesa japonês era inferior ao do chinês. Isto é, os japoneses não tinham uma “linha de produção” como a China, e os seus mesatenistas eram, em sua maioria, amadores – que conciliavam o esporte com algum outro trabalho (Chire era uma das poucas profissionais na época). Os locais de treinamento no Japão eram de “segunda categoria”, se comparados aos da China.
Então, quando Chire entrou na área de jogo em Hiroshima, não era exatamente a favorita. Mas tinha muita técnica, determinação, pernas rápidas e contava com o apoio da torcida local. Ela superou as três adversárias chinesas e conquistou o título dos Jogos Asiáticos. Depois da vitória, ela deu a seguinte declaração à imprensa:
“Estou mais feliz ganhando o título dos Jogos Asiáticos pelo Japão do que quando ganhei o título mundial pela China. Amo muito minha pátria mãe agora.”
Participações olímpicas
Chire Koyama teve finalmente a chance de disputar uma Olimpíada em Atlanta-1996. Participei deste evento como atleta e vi o burburinho em torno dela, ou seja: Chire estava sempre cercada por seu staff e era seguida pelos fanáticos torcedores japoneses. Será que a campeã repetiria o desempenho dos Jogos Asiáticos-1994? Para a preparação a Atlanta-1996, Chire convidou alguns mesatenistas para treinar com ela no Japão, dentre eles o grande Cláudio Kano – morto pouco antes de Atlanta-1996 em um acidente de moto.
Em solo americano, Chire Koyama ganhou seus 3 jogos na fase de grupos e garantiu um lugar na chave principal. Na 1ª rodada (melhor de 5 sets até 21 pontos), venceu uma norte-coreana. Mas nas quartas-de-final caiu diante de Qiao Hong (campeã mundial em 1989 e ouro e prata em Barcelona-1992), que perderia na semifinal para Chen Jing – a campeã em Seul-1988. Chire ainda disputaria os Jogos de Sydney-2000, ocasião em que parou novamente nas quartas-de-final – desta vez diante da eventual campeã, Wang Nan.
Vale destacar que na decisão de simples em Atlanta-1996, no “tira-teima” entre as duas últimas campeãs olímpicas, quem levou a melhor foi Deng Yaping (2 ouros em Barcelona-1992), levando assim o bicampeonato. E também que, a esta altura, Chen Jing conquistou a prata por Taiwan… mas esta história fica para um outro post!