Caio Bonfim ainda não colocou no peito a sonhada medalha de prata olímpica, conquistada na madrugada desta quinta-feira. A cerimônia oficial só vai acontecer nesta sexta-feira no Stade de France, na estreia das provas de pista do atletismo nos Jogos de Paris-2024. Aos 33 anos, 17 deles dedicados à marcha atlética, o brasiliense sabe que mereceu a conquista. Ele estava muito preparado. Desde julho de 2022, foi pódio em todas as etapas do circuito mundial. A consequência natural era a medalha na capital francesa e ele não deixou escapar a chance. Ele merecia esse pódio que coroa toda a trajetória em um esporte que lhe veio como herança de família, mas que não foi fácil de assumir para si. Por tudo isso, Caio fez um desabafo depois de cruzar a linha de chegada.
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“Alguém me perguntou se a prova de hoje foi difícil! Não, não foi! O difícil foi começar a marchar. Quando meu pai me chamou para marchar pela primeira vez, ele dava aula no noturno. E eu fui muito xingado naquele dia (por causa do movimento semelhante ao rebolado que o atleta faz quando marcha). Não é se fazendo de vítima. Eu nasci numa casa em que minha mãe foi oito vezes campeã brasileira, mas eu só comecei com 16 anos. Por que? Porque era muito difícil ser marchador. No dia que eu cheguei em casa e falei para o meu pai que eu queria ser marchador, eu estava querendo dizer que tinha decidido ser xingado sem ter problema”, relembra o agora medalhista de prata.
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Herança de família
Nascido em Sobradinho, cidade-salétite de Brasília, Caio Bonfim tem como mãe, Gianetti Sena Bonfim, que foi marchadora, e como o pai, João Sena, que foi técnico dela. Hoje, ele tem como treinadora a mãe, que estava junto com ele em Paris. “Ela fez índice para Atlanta-1996 e, por causa de algumas mudanças de critério em cima da hora, ela não foi. Em Londres-2012 (primeira Olimpíada dele), eu falei para ela: ‘quem disse que você não é atleta olímpica?’. Hoje nós estamos na quarta Olimpíada, ela com a credencial (de treinadora) dela e eu posso dizer para ela: ‘nós somos medalhistas olímpicos’. Então, é um momento muito especial, que representa todos esses anos. Não é um ciclo olímpico. Olimpíada não é só o que é feito no ano olímpico, muito menos nos últimos três, que foi esse ciclo. É de uma vida”, disse emocionado.
“Eu sou a extensão da carreira dela (da mãe). Meu pai começou a dar aula numa escola e disse que ali tinha que ter aula de atletismo. Surgiram grandes atletas como a Carmen de Oliveira, que foi a primeira brasileira a ganhar a São Silvestre. Depois, veio minha mãe. Eles se apaixonaram, casaram… Eu sou o extensor do trabalho de um cara lá de 1980”, recorda.
Persistência
Além desse apoio familiar tão importante, é preciso destacar também a persistência de Caio Bonfim. Com apenas 21 anos, disputou sua primeira Olimpíada, em Londres-2012. Não passou do 37º lugar. Na Rio-2016, bateu na trave ao terminar em quarto lugar.
“Quando eu passei a linha de chegada no Rio de Janeiro, vocês podem achar aí nas imagens, eu com a mão na cintura, naquele momento eu tava falando, será que eu vou ter outra oportunidade de chegar tão perto?”, relembra.
Demorou, mas a oportunidade chegou. Caio Bonfim amadureceu. Teve grandes resultados como as medalhas de bronze nos Mundiais de 2017 e 2023, mas teve também decepções como o 13º lugar nos Jogos Olímpicos de Tóquio-2020. “Quando fui 13º em Tóquio, eu sentei comigo mesmo e falei: é isso mesmo que você pode fazer? Ficar entre os 10 primeiros do mundo é lindo, maravilhoso, tenho muito orgulho… mas você pode mais. E eu fiz um compromisso comigo”.
E o compromisso foi cumprido neste histórico 1 de agosto de 2024, data em que o Brasil conquistou sua primeira medalha na marcha atlética em Jogos Olímpicos com Caio Bonfim em sua melhor versão.
“Eu falava: quero ter a ousadia do Rio 2016, a experiência de Tóquio e o primeiro amor de Londres. E a
gente conseguiu aqui. Então estou muito, muito contente. É o trabalho de uma vida. Eu não sei dizer pra vocês o que significa isso tudo. Não tô acostumado a ouvir medalhista olímpica. Isso foi um sonho”, finalizou.