Samory Uiki! O nome do atleta do salto em distância combina com sua personalidade. Um herói, que saiu de uma família de baixa renda em Porto Alegre para conquistar o mundo, seja por se formar em relações internacionais nos Estados Unidos ou por ter disputado os Jogos Olímpicos de Tóquio. Homem de personalidade doce, como mel, bom papo e sorriso fácil, Ao mesmo tempo, ele é capaz de quebrar tabus como o costume que hoje tem de pintar as unhas semanalmente. Um cara autêntico, que veio ao mundo para ser diferente do habitual, como seus pais previram desde o momento em que lhe batizaram.
“Meu nome é Samory Uiki. Samory era um herói africano e Uiki significa mel em iorubá, que é um dialeto nigeriano. Então meu nome é nigeriano e meus pais são nascidos no Brasil, toda a minha família é brasileira, mas eles queriam resgatar essa ancestralidade com a África quando foram escolher meu nome. Eles acharam meu nome num livro, que tinha diversos nomes africanos e acharam que seria uma boa para fazer esse resgate”, conta orgulhoso.
A entrada no atletismo veio também sob influência dos pais. “Eu comecei no atletismo com oito anos de idade. Eu entrei na Sogipa através de um projeto social, que dava bolsas para crianças de baixa renda aqui de Porto Alegre. Eu era uma criança que gostava muito de correr, de saltar, de ficar pulando em casa e meus pais acharam que seria uma boa ideia me colocar no atletismo. Eu vim na ideia de que seria uma brincadeira, que seria uma atividade para fazer no segundo turno, mas fui ficando, ficando e 16 anos depois sigo no mesmo clube, fazendo a mesma coisa e muito feliz”.
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O que era uma brincadeira começou a ficar mais sério a partir do momento em que Samory Uiki percebeu que ele poderia conseguir resultados internacionais para o Brasil. O que o despertou foi o Mundial Sub-18 de 2013, na Ucrânia. Na qualificação, o gaúcho fez a então melhor marca da carreira com 7,66 m e se classificou para a final em segundo lugar. Na decisão das medalhas, no entanto, ele não conseguiu repetir o desempenho, que lhe daria a medalha de prata, saltou 7,29 m e ficou em nono lugar, mas voltou para casa sabendo que poderia chegar longe no esporte.
“Foi aí que me deu um clique porque eu fui sempre muito ligado à questão acadêmica também. Sempre priorizei tanto a escola quanto o atletismo também, os dois paralelamente. E a partir deste momento de Mundial Sub-18 que eu entendi que eu podia ir muito mais longe, muito mais além. Então, a partir deste momento eu recebi alguns convites de universidades americanas para estudar nos Estados Unidos e comecei a encarar mais profissionalmente, não tanto como brincadeira ou hobby, mas como profissão mesmo”, explica.
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Em 2015, o destino de Samory Uiki foi os Estados Unidos. Com uma bolsa de 100%, ele entrou para o programa de esportes da Universidade de Kent, no estado de Ohio. “Aceitei o desafio, que era também um sonho já que a questão do estudo sempre foi muito forte em mim e eu queria continuar estudando e treinando. Aqui no Brasil accaba sendo um pouco difícil de fazer isso e lá é o ambiente perfeito para você conciliar o estudo com o esporte por todo incentivo e toda a estrutura que tem. Me formei em relações internacionais nos Estados Unidos com especialização em comércio internacional e ciência política. Quero trabalhar com refugiados, imigração e trabalhar essa questão da inclusão pelo esporte”, revela.
De 2016 até junho de 2019, Samory Uiki participou apenas de competições universitárias nos Estados Unidos. A volta para casa aconteceu por causa do sonho de disputar os Jogos Olímpicos, mas ele não passou do sétimo lugar no Troféu Brasil com a marca de 7,43 m, bem abaixo dos 7,82 m, melhor salto obtido por ele em seu período defendendo a Universidade de Kent.
Mas os planos olímpicos de Samory Uiki sofreram um atraso por causa da pandemia em 2020. Por causa da Covid-19, apenas uma competição foi disputada por ele: o Troféu Brasil, em dezembro, em Bragança Paulsta, e ele sentiu que precisava de um incentivo diferente para se dar bem.
“Sabe que atleta é muito supersticioso, né? E eu senti que eu estava precisando de alguma coisa para talvez dar uma elevada, dar um gás. E tem um garoto aqui do Sogipa que chegou um dia com a unha pintada, a namorada dele estava fazendo acho que curso de manicure e fez um teste nele. Eu olhei as unhas deles e falei: acho que é isso aí que eu vou fazer. Aí fui para o Troféu Brasil com as unhas pintadas de preto e saltei a melhor marca da minha vida. Aí, já viu, né? Ficou para sempre! Agora virou um hábito meu. Eu vou na manicure quase toda semana. Já está todo mundo acostumado. Virou superstição”, se diverte.
Naquela edição do Troféu Brasil, Samory Uiki igualou sua melhor marca pessoal ao fazer 7,82 m nas eliminatórias e saltou 7,93 m na final para ser vice-campeão e bater seu recorde. Mas o melhor ainda estava por vir. O herói de unhas pintadas alcançou em abril de 2021, no Troféu Cidade de Bragança Paulista, 8,23 m e garantiu, por apenas 1 cm, o índice para disputar os Jogos Olímpicos de Tóquio.
“Mesmo você estando há 16 anos trabalhando, é muito distante pensar que você vai para uma Olimpíada e conseguir realizar isso foi maravilhoso este ano. Foi muito mágico e, para mim, ainda não caiu a ficha. É difícil você pensar depois que foi para uma Olimpíada. É uma coisa que não cabe na mente. Primeiro que sou um cara que consome muito da cultura do Japão, eu leio muitos mangás, eu vejo muito anime. Desde criança, eu fui muito fissurado na cultura japonesa. Foram dois sonhos ao mesmo tempo: ir para o Japão e ir para uma Olimpíada. Foi muito especial e extremamente mágico”, lembra fascinado.
O resultado, no entanto, ficou longe do melhor que ele já tinha feito. Na qualificatória, Samory Uiki saltou 7,88 m em sua primeira tentativa, mas queimou as outras duas. Por oito centímetros, ele não conseguiu entrar na final. Se tivesse saltado os 8,23 m de abril, teria se classificado em segundo lugar e, se tivesse repetido o feito na decisão da medalha, teria ficado com o bronze, já que alguns dos favoritos tiveram problemas físicos na briga pelo pódio. Apesar disso, Samory Uiki não tem motivo para se lamentar.
“Meu objetivo da Olimpíada era ir para a final do salto em distância, ficar entre os 12 melhores. Eu acabei ficando em 16.º, que não foi uma coisa ruim. Foi a minha primeira Olimpíada e eu tive um probleminha de lesão um mês antes. Então, apesar dos pesares foi extremamente positivo o saldo que eu tiro dessa Olimpíada”, finaliza.