A um ano da abertura da Paralimpíada de Tóquio-2020, Andrew Parsons, presidente do IPC (Comitê Paralímpico Internacional), mantém suas posições. Reforça a atual política da classificação funcional, o compromisso em entregar os Jogos para 2021 em meio à pandemia e a busca pelo equilíbrio em meio às polêmicas.
“O esporte de alto rendimento é excludente por natureza. O desporto paralímpico acaba sendo assim também”, diz Parsons.
Andrew Parsons
Na presidência desde 2017, Parsons viu as controvérsias classificações funcionais ficaram ainda mais polêmicas. Especialmente, o caso de André Brasil, detentor de 14 medalhas paralímpicas no currículo, agora inelegível e sem poder competir.
A classificação funcional foi criada para equilibrar e garantir a participação de paratletas com os mais diversos tipos de lesão ou restrição motora. O objetivo é colocar todos em condições de igualdade para as competições.
O presidente acredita que a ciência é o caminho certo para e que muito ainda está para ser feito e aprimorado. “Não posso e nem tenho competência para interferir em casos de ilegibilidade. Não dá para ser justo com apenas um atleta. Meu trabalho é que o mais justo seja aplicado para todos. Quanto mais ciência, melhor. Daí, as coisas ficam mais claras.”
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Ciência acima de tudo
O movimento paralímpico sempre foi uma forma de inclusão social, de mostrar para o indivíduo com deficiência, perante toda sociedade, que há uma capacidade e potencial dele ser atleta. Mas na elite do paradesporto, a cada dia que passa, as ideias parecem ser outras.
“É um movimento com organizações de alto rendimento. Por isso temos que ter regras e limites muito bem definidos. Pequenas alterações, e medalhas de ouro vão para outros atletas e comitês.”
Chega a ser um paradoxo. O esporte que tanto fez pela inclusão das pessoas com deficiências, também age para excluir e negar oportunidades.
“Os surdos não fazem parte do programa paralímpico, assim como os autistas. Pessoas com síndrome de down não chegam no alto rendimento, é difícil achar um equilíbrio. Síndromes de dor também não entram. A dor não é mensurável, e tudo para a classificação tem que ser mensurável. Sem deficiência física mensurável não tem como. E a classificação funcional sempre terá seu aspecto polêmico”, crava Parsons.
Mesmo defendendo com unhas e dentes o trabalho do IPC na classificações funcionais, o presidente reconhece que a ciência vai passar por cima do indivíduo e que nem sempre isso será benéfico.
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“É preciso definir quais os limites, qual a deficiência mínima em cada modalidade para ser elegível. Isso exige um rigor científico muito grande, e a inclusão tende a cair em prol do conjunto. Mas é um equilíbrio muito complicado de se conseguir. Não estamos contentes.
Incerto
Para deixar tudo ainda mais tenso, a Paralimpíada de Tóquio-2020 ficou perto de ser cancelada por causa da pandemia. “Foram emoções muito diferentes”, diz Parsons sobre 2020. “O que começou pra todos como um fenômeno na China, em janeiro e fevereiro, foi avançando, ganhando outras proporções. Claro, teve uma frustração grande.”
Só que o adiamento foi acertado, e para Andrew Parsons isso foi o menor dos problemas. “A decisão não foi difícil de tomar. O complicado foi conviver com efeitos da decisão. O calendário já estava sendo cancelado e isso afeta os qualificatórios, trazendo uma incerteza muito grande, principalmente para os atletas.”
Neste contexto, a classificação funcional pode se tornar um problema. Desde Londres-2012, as revisões têm sido feitas em competições que antecedem os Jogos Paralímpicos. Mas com o calendário incerto, e para receio de Andrew Parsons, a classificação pode ter de ser feita dias antes da Paralimpíada de Tóquio.
“Em Pequim foi a última vez que foi assim. A gente não fez mais isso no Rio e em Londres porque era um grande complicador.” De acordo com o presidente, o IPC estima ter de classificar um quarto dos atletas que irão para Tóquio, pouco mais de mil atletas.
“Temos que ajustar o sistema de qualificação ao que seja possível e ainda realizar a classificação. Então temos planos para todos os cenários. Se voltar em dezembro é um plano, janeiro outro, março outro.”
No olho do furacão
Parsons está administrando uma crise nunca vista, um adiamento que irá mudar a forma como se organizam os Jogos Paralímpicos. “Aquela exuberância de Pequim não vai existir mais. Talvez seja uma oportunidade para o futuro, focado no fundamental, como algo que sirva de modelo. Aprender a fazer a competição de outra maneira.”
Simplicidade, essa é a palavra do momento para a organização de Tóquio-2020. Que também está tendo que lidar com uma pandemia que deixa pouquíssima margem para planejamentos de longo prazo.
“Não dá para ficar sentado lamentando a pandemia. Eu não vou inventar a vacina. Não sou autoridade em saúde em nenhum nível. Vou ajudar a fazer um planejamento adequado para os Jogos. Trabalhar com o Comitê Organizador, COI e autoridades do Japão. Tudo para colocar a Paralimpíada de Tóquio em pé.”
Diferenças
Andrew Parsons também já foi presidente do CPB (Comitê Paralímpico Brasileiro) de 2009 a 2017, quando assumiu o posto no IPC. Com ele no comando, o esporte paralímpico brasileiro deu um salto, tanto nos investimentos que atraiu quanto nos quadro de medalha.
Agora ‘do outro lado do jogo’, Parsons acredita que tinha muito mais capacidade de executar mudanças quando comandava o CPB. “A nível internacional é muito mais lento. Não guarda semelhança alguma com o que eu fazia no Brasil.”
A sede do IPC fica na Alemanha, mais precisamente na cidade de Bonn. “A legislação alemã é muito rigorosa. A velocidade é outra, ainda existem todos os indivíduos e entidades que você tem que envolver para tomar uma decisão. A minha função como presidente é mais administrativa. No CPB era mais executiva.”
A um ano da Paralimpíada de Tóquio, Andrew Parsosn terá que administrar como nunca, já que a pressão para realizar a Paralimpíada em meio à pandemia devem aumentar, bem como a insatisfação de muito atletas e seus comitês nacionais.