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OTD Entrevista

Joanna Maranhão pede mais ambição à natação feminina

Joanna Maranhão comenta carreira e momento da natação no Brasil
Satiro Sodré/SSPress/CBDA

Carreira, política e momento atual da natação no Brasil. Confira tudo o que Joanna Maranhão falou em entrevista exclusiva ao Olimpíada Todo Dia.

Começou a nadar aos três anos de idade, a competir aos 12 e a integrar a seleção brasileira de natação aos 14. Joanna Maranhão assumiu grandes responsabilidades cedo e, hoje, evidencia publicamente seus ideais, independente de quais sejam.

Longe das competições em alto nível, a atleta brasileira de 31 anos não quer se afastar do esporte, que vê como meio de inclusão social, causa que defende com orgulho. “Eu já dei inicio ao processo de transição, começando a olhar outros caminhos da minha vida para além de ser atleta de natação competitiva, mas isso nunca vai deixar de fazer parte de mim. Eu nunca vou ficar distante de piscinas”, contou Joanna em entrevista exclusiva ao Olimpíada Todo Dia.

Pelo Brasil, a nadadora já conquistou muitas medalhas, como a prata (4x200m livre) e o bronze (200m borboleta e 400m medley) nos Jogos Pan-americanos Toronto 2015, além das garantidas em Guadalajara 2011, Rio 2007 e Santo Domingo 2003. Mas, atualmente, Joanna não vê a natação brasileira evoluindo como gostaria.

“A gente tem, como sempre teve, potenciais medalhistas mundiais e olímpicos. Mas é um caminho muito longo para se trabalhar e se pensar na fomentação da base”, considerou a atleta.

“Em termos de natação feminina, eu sinto muita falta de um número maior de meninas nadando todas as provas e encarando mais o cenário mundial ao invés de se fechar só no objetivo de ser campeã brasileira. Eu sinto falta de um pouco de ambição, de um olhar de reformulação do que é o objetivo da natação feminina do Brasil”, concluiu.

Confira a entrevista completa com Joanna Maranhão:

Conte sobre sua relação com a natação: quando começou e quem mais te incentivou?

Eu comecei a nadar aos três anos de idade, no Clube Português, por uma questão de segurança. Minha mãe queria que os três filhos soubessem nadar. E foi uma coisa sem nenhuma projeção de se tornar atleta, foi um encontro e as coisas foram acontecendo. De alguma maneira eu sempre tive muita facilidade em assimilar tudo o que tivesse a ver com água. Eu aprendi a nadar os quatro estilos relativamente cedo e consegui desenvolver uma técnica hidrodinâmica e rápida para isso. Mas foi uma coisa muito natural e sem nenhuma projeção de como isso poderia se desenvolver.

As pessoas que mais me incentivaram sempre foram os meus pais. Minha mãe e meu pai sempre estiveram muito presentes. Quando eu era mais nova, minha tia-avó e minha avó materna que me levavam sempre para os treinos. Depois que meus pais se separaram, quando eu tinha 15 anos, minha mãe se tornou peça chave para a continuidade e minha perseverança enquanto atleta. O público tem mais conhecimento da minha mãe, porque foi ali com 15 anos que comecei a me tornar “pública”, então a presença dela sempre foi muito marcante. Mas eu não tenho como deixar de falar da importância que meu pai teve na base, e da minha avó e tia-avó também.

Acha que ter começado a competir e ter grandes responsabilidades muito cedo ajudou ou prejudicou a sua formação como pessoa?

Eu acho que só ajudou, por ter sido de uma maneira muito natural – ninguém nunca me forçou, eu nunca tive muito medo de competir e meus pais não tiveram que insistir, nunca teve nada disso. É uma coisa que foi acontecendo. Você tem que lidar com situações de pressão e competitividade que, querendo ou não, são da vida. A gente compete por uma vaga na faculdade, por uma vaga de emprego, por promoção. Enfim, a vida é uma competição, em maior ou menor grau. Acho que só me ajudou a aprender a lidar com situações de pressão e de competitividade no momento certo.

Em todos esses anos, você consegue eleger o momento mais importante da sua carreira de atleta?

Eu acho muito injusto com os outros momentos escolher o mais marcante da minha carreira. Lógico que tem uns que são mais emblemáticos, como ter sido a 5ª do mundo com 17 anos – é o que as pessoas valorizam mais porque foi o mais expressivo. Mas eu tenho um carinho muito grande pelos momentos que na hora são vistos como fracassos, u tenho que ter muito respeito por eles, porque foram eles as “molas” que me impulsionaram para tentar de novo e desenvolver a melhor Joanna que eu poderia ser.

Eu considero os Jogos Olímpicos de Pequim, que em termos de posição foi a minha pior colocação, mas foi quando eu realmente percebi que era possível voltar a nadar rápido e bater o recorde sul-americano. E o Pan-Americano de 2015, a prova de 400 metros medley, que depois de 11 anos eu consegui melhorar o meu tempo na prova. Foi muito emblemático para mim conseguir ser mais rápida em uma prova em que o tempo fisiológico já estava passando, eu já estava com mais idade. Mas ter conseguido ser mais rápida foi bem incrível.

Você acredita que o esporte ajuda a formar o caráter das pessoas?

O esporte, para além de formação cidadã, é inclusão social, educação, noção de civilidade, honestidade, moral e ética. Tudo depende do que é ensinado e como é ensinado. Assim como tudo na vida, ele também pode ter um viés negativo, você pode pegar atalhos como o uso de substâncias ilícitas ou fazer o que quer que seja com o seu adversário para prejudicá-lo. Quando você toma a consciência de que é você, seu corpo e seu próprio espaço, e desenvolve a melhor versão dele, é extremamente positivo.

Você pensa que seu engajamento e sua maneira de agir e pensar sobre política pode influenciar os fãs do esporte e seus, em específico?

Eu entendo que seja muito difícil para as pessoas de fazer esse discernimento entre Joanna enquanto atleta que representa o Brasil e a mesma pessoa que tem um posicionamento político que muitas vezes vai na contramão do que a maioria pensa nesse cenário polarizado. Mas essa sou eu, nunca deixei de fugir de nenhum enfrentamento, ainda que seja ideológico. Eu não acho que sou detentora da verdade, mas a minha inclinação política sempre foi e sempre será em prol daquelas pessoas que não tiveram as mesmas chances que eu. Acho que não pode existir nenhuma prioridade nesse país que não seja a diminuição da desigualdade social.

Não considero que exista um único caminho ou uma única solução para isso, mas sim a construção disso. Eu sempre peço para as pessoas tentarem fazer esse discernimento, às vezes elas conseguem outras vezes não. Mas de uma maneira geral eu consigo, com esse público e até com um público que pensa diferente de mim, um diálogo. Muitas vezes o que pensa diferente me ensina muito também, ainda que me ensine como eu não quero ser ou o caminho que eu não quero seguir, o outro sempre tem alguma coisa para me ensinar. Para mim, é muito bom.

Acha que sua postura “crítica” já te prejudicou na carreira?

Na minha carreira, em termos de resultado, absolutamente não. Me ajudou muito colocar para fora tudo o que eu pensava. Mas em termos de enfrentamento junto à antiga gestão da CBDA, a qual eu era muito crítica e sofria muita retaliação e perseguição, sim, atrapalhou minha carreira.

Acho que em termos de patrocínio também, porque as empresas querem aquele modelo do atleta “super-herói”, que só fala de quando ele ganha e é um “robozinho”. Mas eu não me encaixo nesse perfil e eu até poderia tentar seguir por esse caminho, mas eu acho que ia bater de frente com o que eu acredito, que é o processo de humanização e da construção de um mundo mais fraterno. Não dá pra gente negar as nossas imperfeições por sermos pessoas públicas, então eu nunca fiz isso. Talvez nesse sentido tenha atrapalhado, mas nada do qual eu me arrependa.

Como é sua relação com a política? Já que estamos em ano de eleição, como você vê o momento atual do Brasil?

Eu vejo por um lado uma oportunidade de se rever posturas que eram tidas como aceitas em todos os sentidos: políticas, sociais, de tratamento, de questão de gênero… Vejo uma oportunidade da gente construir junto uma nova maneira de se pensar o país. Mas, por outro lado, vejo de uma forma muito perigosa uma polarização que tenta fazer essa dicotomia do certo e do errado, do corrupto e do honesto, quando na verdade o ser humano é plural. Eu acho perigoso colocar na mão de uma única pessoa a solução do país. A solução está no todo, está no micro – que é cada um cuidando e vigiando as próprias ações – e está no macro também – nesse cenário político.

Ainda que o meu posicionamento não seja o que a maioria acredita como solução, eu fico com ele porque é o que eu de fato acho correto. O momento em que o fato de uma pessoa não ter condição de fazer três refeições básicas por dia por questão de dinheiro não me sensibilizar, acho que eu falhei enquanto ser humano.

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