A partir da semifinal do handebol feminino nos Jogos Pan-Americanos, um barulho diferente vinha das arquibancadas do ginásio da Villa Deportiva Nacional, em Lima. Os gritos de incentivos surpreendiam os desavisados. Para quem é fã da modalidade, talvez seja fácil acertar de qual grupo nos referimos. Os Chapolins Brasileiros haviam desembarcado na capital peruana para apoiar os atletas da delegação durante toda a competição. Com fantasias azuis, eles roubaram a cena nas partidas do Brasil e entraram para o livro de grandes histórias do evento. Entre veteranos e estreantes, o grupo demonstra a paixão por handebol e o incentivo constante ao esporte do país.
A trajetória dos Chapolins Brasileiros começou de maneira simples. Há exatos 8 anos, o mero desejo de acompanhar o Pan de Guadalajara já foi o suficiente. Ter dinheiro também seria importante, claro. E deu certo. As definições de torcedores fanáticos foram atualizadas. “Todos que estão aqui gostam de esportes. No início, éramos só quatro. E os quatro resolveram ir para Guadalajara, no México. De lá para cá, a gente participa de todos. Acompanhamos tanto o Pan-Americano quanto Mundiais e Olimpíadas. Não perdemos quase nada. Estivemos em Guadalajara, Toronto e, agora, em Lima. Marcamos presença nos Jogos Olímpicos de Londres e no Rio. Vamos em quase todos os Campeonatos Mundiais de handebol, é o nosso esporte predileto, mas acompanhamos todo o resto. Se der para ir, a gente vai. Já estamos nos preparando para Tóquio no ano que vem. Fazemos uma coleta financeira mensal com todos os participantes do grupo. Já está quase certo”, contou José de Aviz, de 41 anos, um dos fundadores.
A maioria do conjunto vem de Belém, capital do Pará. Com o crescimento do número de membros, os Chapolins já alcançaram outros estados do Brasil. Afinal, o que motivou a escolha do personagem? “Tivemos a ideia de fazer alguma fantasia que puxasse a torcida mexicana para o Brasil. Como todo mundo gosta do personagem Chapolin, a gente resolveu fazer o Chapolin. E eternizou. Em Londres 2012, tentamos com a família real inglesa, mas com as cores verde e amarelo. Fez sucesso. Quando fomos para o futebol masculino, final entre Brasil e México naquela derrota horrorosa por 2 a 1, o Chapolin fez mais sucesso no estádio de Wembley do que nas outras competições que fomos com a família real inglesa”, explicou Rubens Tófolo, outro que faz parte desde a primeira geração.
Atualmente, os Chapolins Brasileiros contam com cerca de 30 pessoas. Pouco mais da metade está acompanhando os Jogos Pan-Americanos no Peru. Aos 27 anos de idade, Gustavo Cardoso é paulista, mas reside em Volta Redonda, no Rio de Janeiro. Já com sotaque carioca, participou pela primeira vez da viagem com o restante dos companheiros. As impressões iniciais foram boas. “O calendário também está diferente do que costumam ser as Olimpíadas. Natação vai ser na segunda semana, assim como o judô. A galera está muito animada. É um clima diferente, tem essa coisa latina. O pessoal é mais passional, é muito mais festeiro. Talvez seja uma coisa que não tenha em Tóquio, onde o japonês é mais pragmático. Até o clima do Pan é mais leve, não tem aquela coisa de objetivo, foco, meta, medalha olímpica. O Pan é um clima mais leve, de confraternização também. É legal ver a América do Sul sendo exaltada, está dando gosto de ver. Dá para perceber como os peruanos estão abraçando isso, como eles estão com orgulho de estar recebendo esse evento. É um clima de felicidade. Nossa cultura é magnífica, temos que nos valorizar e nos unir. Eu gosto dessa festa.”
“O ticket médio gira em torno de 35 reais, é um preço acessível. Eu acho que esses eventos têm que ser acessíveis para a comunidade daquele país. Do que adianta fazer o evento no Peru se o peruano não tem acesso? Assim como foi na Olimpíada do Brasil. O brasileiro, no geral, não tinha acesso. No Japão vai ser a mesma coisa. Ou você gasta uma grana, ou você não vai. É muito legal essa ideia do Pan e dos Jogos Sul-Americanos de ter ingressos acessíveis. Tem que atingir a comunidade. Tem que ter criança, tem que ter todo mundo aqui. O esporte vai além disso. Estou aqui sentado, mas tem argentino, peruano… Essa vivência que é muito legal”, complementou.
Apesar da parte positiva, Lima registra certas dificuldades estruturais. Atletas, jornalistas e torcedores enfrentam problemas com o sistema de deslocamento oferecido pela organização dos Jogos Pan-Americanos. Além disso, o trânsito caótico da cidade é outro fator que incomoda, assim como a quantidade de cambistas. “Falta uma explicação melhor sobre como que se faz o transporte. Conversando com uma voluntária, eu descobri que existe um cartão para você poder utilizar o transporte. Você recarrega e vai utilizando, gastando o crédito. Eu pesquisei em vários sites e não achei essa informação. Algumas arenas são muito longe. Uma coisa que me incomodou muito foi a dificuldade de conseguir alguns ingressos, que acabaram muito rápido. Nós tínhamos seis ingressos para o levantamento de peso, mas somos em nove. Chegamos ao local e não nos deixaram comprar, falaram que estavam esgotados. Entramos lá, a arena estava vazia. Eu já ouvi falar muito sobre a questão do cambismo peruano, é algo muito forte por aqui. Nenhum evento é perfeito. Por enquanto, está muito legal”, finalizou Gustavo Cardoso.
De tanto viajar e participar dos principais eventos esportivos, os Chapolins Brasileiros colecionam causos engraçados que aconteceram por aí. É difícil não imaginar as cenas. “O que marcou mesmo foi o Mundial da Sérvia, em que as meninas foram campeãs de handebol. Sem igual. Mas no Pan de Guadalajara, compramos ingresso para o vôlei feminino, jogo entre Brasil e Cuba. Nossos lugares já estavam com outras pessoas. Por incrível que pareça, eram brasileiros que estavam nos nossos lugares. Falaram que poderíamos sentar em qualquer outro lugar. Sentamos em um lugar que escolhemos para assistir ao jogo, mas o dono chegou e mandou a gente sair. Foi uma confusão só, acabaram chamando a polícia (risos)”, revelou José de Aviz.
“Em 2013, nas quartas de final do Mundial, a Seleção feminina ganhou da Hungria. Foram duas prorrogações. Eu sou muito amigo da goleira Mayssa. Quando acabou o jogo, ganhamos e estávamos com duas jogadoras a menos. Ela (Mayssa) veio me abraçar. E eu sou muito baixinho. Fui ficando na ponta do pé, na ponta do pé… Quando eu vi, eu caí dentro da quadra e quebrei uma câmera. O problema não foi a câmera. Os sérvios achavam que eu tinha invadido a quadra. Me levaram para a polícia, perdi o passaporte, queriam me deportar. Sorte que tínhamos um guia, que é sérvio. Virou aquela briga toda. O guia sérvio falou para invertamos uma desculpa de que eu tinha escorregado, caído na quadra e me machucado. Ele disse “finge que está mancando, que quebrou o cotovelo. Vamos para o médico fazer o exame de corpo de delito e vamos jogar um processo contra o ginásio”. Ficou naquela discussão. No final das contas, me liberaram. Não caio mais na quadra para não ir embora de vez (muitos risos)”, detalhou Rubens Tófolo.