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Abertura à diversidade no esporte: a luta do Unicorns Brazil

Líderes do grupo, Pedro Gariani e Daniela Lopes falaram ao OTD sobre a importância da representatividade no esporte

Unicorns Brazil - Daniela Lopes - Pedro Gariani - Diversidade no esporte - LGBTQIA+
A equipe do Unicors Brazil (Instagram/unicornsbrazil)
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Domingo a tarde, jogo de futebol, estádio lotado. O goleiro se prepara para cobrar o tiro de meta, quando aquele grito famoso e infeliz ecoa pelas arquibancadas e escancara a cultura homofóbica e machista que ainda persiste, de maneira geral, dentro do futebol. Há cinco anos, três amigos gays se juntaram para criar uma alternativa à esse cenário e fundaram, assim, o Unicorns Brazil, um grupo esportivo que luta pela abertura à diversidade no esporte. “O esporte tem uma força de mudar a vida das pessoas”, disse Pedro Gariani, um dos fundadores. E é exatamente isso que o grupo tem feito e oferecido às pessoas, como Daniela Lopes (conheça abaixo) e à comunidade LGBTQIA+.

“No começo desse movimento, era muito difícil encontrar outras pessoas gays que se interessavam por futebol, porque eles próprios não acreditavam que podiam jogar bola sabe?! Muita gente teve alguma experiência traumática, no colégio, no trabalho, envolvendo futebol, que remetia a uma lembrança de bullying, saia justa… Então a gente sempre encontrou muita resistência no começo para trazer pessoas para o futebol”, contou Pedro Gariani ao Olimpíada Todo Dia

+O esporte deu a força para Isadora Cerullo ser quem desejava

“Naquele momento, há cinco anos atrás, não tinha ninguém fazendo isso dentro do futebol. O futebol masculino sempre foi um esporte muito hétero, com muito preconceito…Ainda tem uma masculinidade tóxica muita absurda. As pessoas julgam muito sabe?! O jogador deveria ser analisado pelo que ele faz dentro de campo e não pela vida pessoal dele. Isso não diz respeito a ninguém que está ali torcendo. E aí a gente foi formando um grupo aos poucos e construímos um time, mas por diversão, não competição. Isso acabou trazendo bastante holofote para a gente e conseguimos trazer luz para essa pauta do esporte gay”.

Para além do futebol

O futebol foi o pontapé inicial do Unicorns Brazil. Mas aos poucos, o grupos foi expandindo os horizontes. Hoje, eles oferecem também treinos de corrida, funcional e mais recentemente de vôlei

Unicorns Brazil - LGBTQIA+
O time de vôlei do Unicorns Brazil (Instagram/unicornsbrazil)

“Eu odeio futebol e eu falei para os meninos que, assim como eu, tem muitas pessoas que não gostam de futebol e gostariam de praticar algum esporte em um ambiente que elas se sintam confortáveis. Então por que a gente não abre outras frentes e inclui outras modalidades? E esse processo foi muito legal, porque a gente conseguiu reunir várias pessoas que não tinham nenhuma identificação com futebol e esse ambiente se tornou um espaço de convivência e de conectar pessoas”, explicou Pedro Gariani. 

“A preocupação nossa desde sempre foi criar um ambiente positivo, onde as pessoas se enxerguem, onde todo mundo é acolhido e se sinta à vontade. Porque muitas vezes você tem medo de ir a algum lugar com medo de ser julgado pela sua aparência ou por quem você é. E a Unicorns Brazil é sobre isso. A força geradora que o esporte tem de mudar a vida das pessoas, tanto pela saúde física, como mental”.  

Levantando a bandeira trans

Depois de alguns anos da criação do Unicorns Brazil, Pedro Gariani e seus sócios sentiram a necessidade de trazer uma mulher para o grupo. E ninguém melhor que Daniela Lopes, mulher transexual, que se tornou líder da comunidade da adidas runners dentro do Unicorns, quando eles conseguiram a parceria com a marca e abriram os treinos de corrida. 

E antes de falar sobre o papel de Daniela no Unicorns, vamos conhecer sua história de superação e aceitação. “Eu tive uma infância muito angustiante e de muito medo. Eu sempre tive muito medo da rejeição, então escondia esse sentimento, esses desejos por muito tempo. Hoje a gente já tem mais informação disseminada, no meio artístico, musical, um barulho se iniciando no esporte… Só que naquela época, não tinha. Então eu não tinha referências para que eu pudesse entender que eu era uma mulher trans. Para mim, eu era um menino gay perdido”, relatou ao OTD

Unicorns Brazil - Daniela Lopes
Daniela Lopes, líder da adidas runners no Unicorns Brasil (Instagram/danielalopess)

“Eu sofri muito preconceito no trabalho. Era algo muito novo para os meus superiores, os clientes, e eles não sabiam lidar. Então teve momentos em que minha gerente chegava para mim e falava que eu tinha que me trocar, tirar a maquiagem, o brinco, porque eu estava chamando muita atenção. Ou já aconteceu de clientes entrarem e falarem que não queriam ser atendidos por mim. Vi preconceitos quando comecei a frequentar academia, de ir ao banheiro feminino… É muito triste. A gente sofre preconceito de todos os lados. Uma trans sofre preconceito na família, na rua, por mulheres, por homens e até mesmo dentro da comunidade LGBT”.

Os pontos de virada 

A vida de Daniela Lopes, no entanto, começou a mudar há cerca de seis anos. “Eu sentia um aspecto feminino em mim e adotei esse estilo por muito tempo na juventude para poder me expressar. Quando eu tinha 23, 24 anos comecei a pesquisar e via mulheres trans que eram modelos, tinham uma certa visibilidade… E passei a acompanhar uma modelo chamada Andreja Pejic, que tinha um estilo andrógino. Quando eu vi que ela passou pela transição, comecei a pesquisar mais a fundo e entender mais sobre os transgêneros. E foi aí que eu falei: ‘opa, é isso!’ Foi um estalo, uma chave que virou dentro de mim, porque até então eu não tinha informação do que era um transgênero”.

Uma vez que Dani se encontrou, ela encontrou também o esporte. Passou a frequentar os treinos da adidas runners e lá se sentiu acolhida. E consequentemente, a corrida teve um papel fundamental no seu processo de aceitação.

Daniela Lopes - Diversidade no esporte
Daniela Lopes tem 29 anos (Instagram/danielalopess)

“Eu, como mulher trans, sempre tive muito receio de falar abertamente sobre isso, de estar com pessoas e elas saberem que eu sou trans. Às vezes as pessoas percebiam, às vezes não. Então eu não falava sobre o assunto e o esporte me ajudou a entender e lidar com isso. O esporte ajuda você a lidar com o seu corpo, porque acaba quebrando vários tabus estéticos. A gente tem aquela imagem de que quem pratica esporte tem um físico uau, aquele corpo perfeito e não é assim. Cada um tem o seu corpo, a sua beleza e é importante a pessoa entender esse processo”.   

A importância da representatividade  

O esporte não se tornou apenas um estilo de vida para Daniela Lopes. Ele virou também o seu microfone na luta pela diversidade no esporte e na vida.“O Unicorns Brazil queria uma mulher que representasse a comunidade LGBTQIA+ e levantasse essa bandeira. E ter uma mulher trans é essencial para a gente levantar essa questão. Eu aceitei a proposta justamente para defender que uma mulher trans pode estar em qualquer lugar que ela queira e sinta bem”.  

Além de dar um espaço de aceitação e abertura à diversidade no esporte, o Unicorns Brazil e Daniela Lopes fomentam a discussão e aumentam a representatividade LGBTQIA+ no mundo esportivo. 

Daniela Lopes - Diversidade - LGBTQIA+
A importância da representatividade (Instagram/danielalopess)

“A representatividade é muito importante, porque a gente consegue despertar sonhos nas pessoas. Acho que o que mais dificulta pessoas trans em lutar pelos seus sonhos é o fato de elas não se sentirem representadas. Então no momento em que você encontra a Tiffany ou outro atleta no alto rendimento, fazendo o que ela ama, lutando e resistindo ao preconceito, dá oportunidades de outras trans sonharem. Então o mais importante é a gente poder mostrar que você pode estar ali”, ressaltou Daniela.

“Quando eu era criança, adolescente não tinha nenhuma figura, nenhuma representatividade. Hoje eu já vejo mais, no cinema, na música, na televisão… É pouco? É! Mas é um começo”.

“No ano passado, a mídia trouxe muito a tona a questão da diversidade no esporte, com alguns casos emblemáticos que ajudaram a gente a fomentar a discussão. Mas eu acho que é um processo. Quanto mais a gente falar sobre diversidade no esporte e conscientizar pessoais, mais a gente vai conseguir melhorar esse ambiente. Mas ainda está muito longe de chegar no ideal”, acrescentou Pedro Gariani.

Unicorns Brazil - Diversidade no esporte - LGBTQIA+
A diversidade no esporte no futebol do Unicorns Brazil (Instagram/unicornsbrazil)

A presença das marcas

Ter uma marca grande apoiando a causa LGBTQIA+ é um fator importante e ajuda a disseminar a discussão sobre diversidade no esporte e até mesmo a representatividade. É o acreditam Pedro Gariani e Daniela Lopes. Mas para eles, não basta apenas apoiar no mês do Orgulho LGBTQIA+. Tem que ser sempre e tem que ser verdadeiro.  

“Toda vez que a gente está no mês LGBT, a gente vê que as marcas gostam de falar de diversidade. Só que onde esta diversidade dentro da marca? É muito importante que várias marcas abracem isso”, pontuou Daniela. 

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“A parceria com a adidas ajudou muito no nosso propósito no Unicorns Brazil de democratização do esporte, porque a gente pode oferecer algo gratuito, de alta qualidade e que qualquer um é bem-vindo, independente de gênero, orientação sexual, cor…”, disse Pedro Gariani.

“E acho que as pessoas olham diferente por ter uma marca grande envolvida. E o mais legal não é só estar ali fazendo parte, é a empresa realmente levantar a bandeira. Isso é importante. Não basta ter uma empresa que se associe a alguma coisa LGBT pelo simples fato de usar aquilo comercialmente. Tem que ser uma vontade genuína de abrir espaço e dar voz para essas pessoas. Isso é o fundamental”, completou. 

Disseminando a mensagem

Dar espaço para que qualquer pessoa possa praticar esporte sem se sentir julgada já é uma missão e tanto. Mas o Unicorns Brazil, Daniela Lopes e todos os envolvidos têm uma missão a mais: passar para frente a discussão. Ou seja, não deixar que a mensagem fique restrita à comunidade LGBTQIA+. Porque essa é uma luta de todos.  

“É essencial a gente poder passar informação para as pessoas, para a sociedade e de transformar isso. É uma coisa nova, delicada. Você vê que não tem informações exatas dentro da medicina, eles ainda estão aprendendo a lidar com isso. Por isso que a gente se sente muito perdida, mas aos poucos, vai se encontrando. É uma luta diária e constante. Por isso, a palavra da jornada de uma mulher trans é persistência”, concluiu Daniela Lopes.  

Unicorns Brazil - Daniela Lopes - Pedro Gariani
Os três fundadores do Unicorns e Daniela Lopes (Instagram/unicornsbrazil)

A gente conseguiu trazer muito mais diversidade para as corridas, porque ali convivem harmonicamente pessoas gays, lésbicas, heteras, mais jovens, mais velhas, homem, mulher… É realmente um ambiente muito diverso e isso é muito importante, porque toda vez que eu vou fazer um discurso nos treinos, eu não estou falando só com a minha comunidade. Eu estou falando com um grupo de pessoas muito maior, que pode levar a minha mensagem para outras pessoas e continuar propagando ela. O fato de a gente ser LGBT e lutar pelos nossos direitos é uma batalha diária. Existem diferenças na nossa sociedade e elas precisam ser corrigidas e combatidas”, finalizou Pedro Gariani.

A razão da semana LGBTQIA+

Este texto dá sequência à série de matérias do Olimpíada Todo Dia sobre o tema LGBTQIA+. O período foi escolhido por ser a semana do dia 28 de junho, reconhecido como dia do orgulho LGBTQIA+.

A data ganhou este título por conta do que aconteceu no bar Stonewall Inn, em Nova York, em 28 de junho de 1969. Neste dia, as pessoas da comunidade gay que frequentavam o estabelecimento se revoltaram contra ações policiais que aconteciam com frequência. O levante contra a situação durou cerca de duas noites e, por conta disso, em de 1º de julho de 1970 aconteceu a primeira edição da Parada do LGBT.

Vale ressaltar que o respeito e a visibilidade à comunidade devem prevalecer sempre, assim como a luta pela diversidade no esporte, e não apenas no mês do orgulho LGBTQIA+.

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