A gestão de clubes do basquete feminino nacional passa por uma revolução. O presidente da Liga de Basquete Feminino (LBF), Ricardo Molina, assumiu o cargo no início de 2017 após Marcio Cattaruzzi, e sua vice, Helen Luz, terem renunciado aos seus cargos após três anos à frente da LBF. Desde então, Molina decidiu encerrar um acordo que a entidade tinha com a Liga Nacional de Basquete (LNB), que organiza o Novo Basquete Brasil (NBB), para que a modalidade feminina tenha um maior crescimento. Em entrevista exclusiva ao Olimpíada Todo Dia, Ricardo Molina falou sobre o processo de independência da LBF, as sugestões para melhoria do basquete feminino do país e a relação da entidade com a Confederação Brasileira de Basquete (CBB).
A LBF se separou da LNB e resolveu se organizar de uma forma independente. Que balanço pode ser feito do que mudou até o momento na questão organizacional? Quais os planos para transformar a LBF em um produto mais atrativo?
Há um ano e meio atrás, a LNB nos recebeu para nos ajudar em algumas partes do desenvolvimento da Liga Feminina. Isso foi feito em conjunto e, para que a gente continuasse por mais uma temporada, a Liga Nacional havia solicitado que toda a gestão da liga feminina fosse da LNB. Os clubes decidiram em conjunto, inclusive, com a liga masculina, que isso não era viável e que a gente ia seguir carreira solo. O que nós temos nesses dois primeiros meses já feitos: nós temos oito pontos de melhorias para a próxima edição do campeonato que já estão planejados. Assim como o campeonato inteiro já está planejado, a temporada inteira já está planejada, nós estamos implantando oito pontos que já serão concretizados para a próxima temporada. Então nestes dois meses, nós já conseguimos fazer o que não tínhamos feito em sete anos de edição. Era modernizar a LBF, transformar em um produto melhor, incrementar algumas novidades, estruturar os clubes…
Quais seriam esses oito pontos que vocês estão abordando?
Primeiro, já é certo que 100% dos jogos da LBF serão transmitidos via web. Por enquanto, o que nós temos é pela página do Facebook. Mas isso já é garantido, pela primeira vez vamos ter um campeonato nacional que vai ser 100% transmitido pela web. A segunda coisa é que nós estamos implementando a cultura dos mascotes, tanto para a liga quanto para as equipes. Todas as equipes terão um mascote, juntamente com a liga, vamos fazer uma interação muito bacana envolvendo as crianças. A gente criou a LBF Academy: durante o ano, nós vamos ter encontros com filiados da liga onde a gente vai capacitá-los em temas específicos. Por exemplo: o primeiro tema que a gente vai fazer com eles será o desenvolvimento de projetos incentivados. Nós vamos trazer uma pessoa especialista nisso para apresentar como fazer projetos incentivados para as equipes. Essa é uma forma de desenvolver as equipes também. Número quatro é a LBF Nova: nós estamos iniciando um estudo científico onde, durante um ano, vamos fazer um estudo científico e didático para justificar a redução da altura da tabela para o basquete feminino.
Em parceria com quem vai ser feito esse estudo?
Nós estamos trabalhando com duas frentes que podem ser ou USP ou Unicamp. A ideia é que em um ano a gente faça todo esse estudo científico e didático e aí, no Jogo das Estrelas do ano que vem, a gente vá fazer o primeiro campeonato de enterradas feminino. Para a gente, este vai ser o marco onde a gente vai entregar à CBB, formalmente, todos os estudos realizados para que a CBB incremente o que ela achar adequado para solicitar à FIBA, que é a entidade maior do basquete mundial, que a LBF 2019 possa ter, de forma experimental, o torneio com a tabela já reduzida. Esse é um ponto que a gente também está trabalhando. Com relação à transmissão de TV, nós estamos garantindo que vamos ter pelo menos 30 transmissões de jogos de TV na próxima temporada, além da transmissão via web.
Essa transmissão seria em qual rede?
Nós estamos negociando. Existe a possibilidade de a gente trabalhar em até duas emissoras simultâneas, uma fechada e uma aberta. Outro ponto, é a LBF Social. Nós estamos desenvolvendo um trabalho social que cada equipe, durante o campeonato, vai montar um projeto social na sua cidade e incentivar esse projeto no sentido de participação, divulgação durante o campeonato. A gente chama isso de LBF Social, é uma área social que a gente quer desenvolver. Não necessariamente o projeto social precisa ser um projeto de basquete, mas é um projeto da cidade. Jogo das estrelas: a gente está mudando o modelo dos jogos das estrelas. A gente está saindo desse padrão de “time da Paula contra o time da Hortência”. Não que não tenha dado certo, mas a gente vai fazer um jogo de um desafio internacional. A gente vai fazer a seleção da Liga contra uma equipe estrangeira. Nós estamos trabalhando a possibilidade dessa equipe estrangeira ser uma equipe da WNBA. Outro ponto é a seleção de novas: nós estamos trabalhando esse ano para ter dez equipes no campeonato, entre elas uma equipe de novas que vai ser a seleção de novas da CBB. A seleção permanente de novas que vai jogar a liga como seleção de novas da CBB. Tem um outro ponto, que seria um nono ponto, que vai ser o LBF Financeiro, em parceria com a Caixa, nós vamos ter pessoas especialistas para orientar atletas, comissão técnica e dirigentes quanto à administração financeira, que é um negócio da Caixa. Só aí são nove pontos que a gente está trabalhando e que, com certeza, já é realidade, já será todo incrementado para a próxima temporada.
Na época em que a LBF saiu da parceria com a LNB, o senhor afirmou em entrevista que a situação era “crítica”. Quão crítica é a situação atual do basquete feminino?
A situação crítica em que sentido, eu não me recordo…
O senhor disse que a situação era “crítica e precisamos de todo apoio para ajudarmos a modalidade” quando foi questionado sobre as razões por que seria mais interessante que a LBF organizasse a sua própria competição. Exatamente quão crítica é essa situação?
A gente estava assumindo uma liga que já estava na oitava edição e não era um produto atrativo. Então você ter um campeonato nacional de basquete feminino sem atratividade com seis equipes não é crítico, é péssimo. O que a gente fez nesses dois meses foi trabalhar muito para alterar esse processo. Como é que a gente vai sair disso? Nós tivemos ontem uma reunião com a CBB, que nós estamos sugerindo para a CBB a naturalização de, pelo menos, três atletas para a seleção feminina e, consequentemente, jogarão a liga. Se a gente esperar que comecem a aparecer outras novas gerações para que a seleção brasileira vá bem e, consequentemente, o basquete feminino comece a girar novamente, é muito tempo. Quando você naturaliza três jogadoras em posições estratégicas, você já tem de imediato uma equipe mais competitiva. Quando a seleção brasileira vai bem, automaticamente gera interesse para o público, gera demanda para os campeonatos nacionais também. Então o que mudou de lá para cá é que a gente está conseguindo implantar um monte de outras coisas com relação ao basquete feminino. Nós encontramos um caminho bacana com relação a como tirar o basquete feminino deste momento crítico que eu falei, que é trabalhar no processo de naturalização e todos esses pontos que eu falei para você, e mudar o patamar do basquete feminino. O basquete feminino estava com uma liga, seis equipes, sem planejamento, sem expectativa e fazendo um campeonato por fazer. Aí você não atrai o interesse de ninguém.
Nesse momento, como está a relação da LBF com a gestão nova da CBB?
A LBF está muito bem não só com a CBB, mas com todas as entidades. A gente tem uma relação muito boa com a LNB e com a CBB. Eu estive com a CBB em três oportunidades, nós tivemos três encontros. No primeiro, eu estive lá no Rio de Janeiro e apresentei o planejamento da LBF para a temporada 2018. No segundo momento, a CBB me pediu para que eu fosse conversar com o representante da FIBA que estava no Brasil para falar de basquete feminino e a gente foi lá. A CBB esteve aqui na nossa sede em Americana, através do secretário-geral Carlos Fontenelle, para falar do basquete feminino, onde a gente entregou a eles seis pontos que a gente precisa que sejam atacados pela CBB para ela melhorar o basquete feminino. Entre os pontos, o que eu acho que é importante citar, a gente está solicitando que a CBB realize, no segundo semestre, o Campeonato Sul-Americano de clubes feminino. No ano passado já não teve e este ano, se o Brasil não estiver como sede, também não vai aparecer quem faça. E que também a CBB alie com a FIBA, que é interessada nestes campeonatos, que volte a ser feito não só o Sul-Americano de clubes, mas também a Liga das Américas e o Campeonato Mundial de Clubes. É uma das formas para a gente poder também reativar o basquete feminino fora do Brasil, que é uma cascata. É uma cascata natural.
Além disso, como foi a recepção dos clubes a essa mudança da LBF? Além dos seis que já participaram da última edição, dos outros clubes do Brasil…
A liga é dos clubes filiados. Os clubes filiados são representados por um conselho de administração, formado por cinco equipes. São esses clubes, que são o conselho de administração, que representam os clubes filiados à liga. Todos esses passos que eu falei com você, a gente divide antes com o conselho. O conselho sempre nos dá o aval para poder andar com relação a isso. Em agosto, no próximo mês, nós vamos fazer um encontro nacional onde nós vamos convidar todas as equipes de basquete feminino que tenham interesse em disputar a liga para uma apresentação de como será a LBF 2018. Neste encontro, a gente vai apresentar de cabo a rabo como vai ser o campeonato 2018. Um dia antes, por mais que o conselho saiba o que está sendo feito, nós vamos aprovar as mudanças que a gente já conversou formalmente para que o conselho aprove formalmente para que, no outro dia, a gente apresente na reunião. O conselho, o tempo todo, está envolvido com relação a essas mudanças.
Há uma preocupação em trazer mais clubes da região Norte-Nordeste para disputar a liga?
Há um interesse muito grande em trazer mais equipes, principalmente que estejam no Sul e no Nordeste. Neste momento, o nosso vice-presidente, que é o Valter, ele está em Petrolina conversando com os responsáveis pelo basquete para ver se a gente consegue viabilizar uma equipe lá em Petrolina. Ele também tem conversado com o pessoal de Vitória. Então nós temos aproveitado o nosso vice-presidente, que é de Recife, para fazer esse trabalho de captação lá no Nordeste.
No caso, esse seria o clube do Vitória ou a cidade de Vitória?
Ele tem falado com a cidade, não com o clube. Sinceramente, eu não tenho exatamente qual caminho ele tem conversado lá. Aqui a gente já foi para o Rio de Janeiro conversar com o Flamengo, já fomos conversar com a equipe do Santos, de Catanduva. Provavelmente na próxima semana estamos descendo no Paraná, para conversar lá com o pessoal de Santa Catarina, de Joinville. Tem outras coisas aparecendo aí.
Quais são as maiores dificuldades financeiras que a LBF encontra nesse momento?
Nós adotamos uma ferramenta de negócios para a LBF. Nós vamos trabalhar muito no modelo de contrapartida. O maior custo de um clube para disputar um campeonato são a arbitragem e a logística. Aí você tem a passagem aérea, o hotel e a alimentação. Esses são os maiores custos de uma equipe. Além disso, você tem a folha de pagamento de cada equipe, que cada um tem a sua. Nós estamos trabalhando para viabilizar esses valores para subsidiar essas equipes desde que, em contrapartida, eles façam outras coisas para melhorar o campeonato, que nós estamos definindo o quê. Nós vamos ter um trabalho de contrapartida. Vai ser o seguinte: “eu vou puxar para você a arbitragem, mas em contrapartida eu vou precisar que você tenha uma assessoria de imprensa com os requisitos mínimos”. Nós estamos aproveitando o subsídio para melhorar o campeonato e as equipes. A maior dificuldade financeira é poder subsidiar esses custos operacionais dos clubes para que eles possam investir na estrutura e na equipe.
O NBB fez uma parceria com a NBA, a liga dos Estados Unidos. A LBF pensa em, de alguma forma, buscar uma parceria com a WNBA ou alguma liga estrangeira, como a espanhola, por exemplo?
Nesse primeiro momento, a gente está buscando uma agenda com o Arnon de Mello, que é o presidente da NBA no Brasil, para viabilizar o jogo das estrelas entre a seleção da liga e uma equipe da WNBA. Esse é o primeiro contato que a gente está tendo com relação a uma possível parceria. A consequência natural vai ser uma parceria maior, com outros temas a serem discutidos, mas esse é o primeiro ponto que a gente está buscando junto ao pessoal da NBA, que também é responsável pela WNBA.
Quais os planos da LBF em usar as jogadoras famosas do passado brasileiro, como Paula e Hortência, para promover essa nova liga a partir do ano que vem?
Uma das coisas que a gente trabalha internamente é essas pessoas que foram nossas referências, como Paula, Hortência, Janeth, a gente precisa de todo mundo junto. A gente precisa fazer com que todos sejam abraçados com o basquete feminino. Primeiro nós, internamente, enquanto liga, temos que justificar a nossa credibilidade e mostrar que estamos mudando o basquete feminino. Naturalmente, nós vamos ter essas pessoas trabalhando com a gente. A gente já tem mantido contato, por exemplo, com a Janeth se colocando à disposição para ajudar a gente. Isso vai acontecer de forma natural e nós vamos abrir a porta para que todos possam estar junto com a gente, não tem nem dúvidas disso.